CADERNOS INTERATLÂNTICOS (49)
Julgo que Utopia of Usurers é a primeira e única obra que Chesterton escreve com a raiva a queimar-lhe a alma. Nas suas páginas o Príncipe do Paradoxo não apenas critica mas profetiza. É a pobreza física dos permanentemente pobres, é a pobreza moral e espiritual de uma classe média cada vez mais reduzida, é a responsabilidade dos muito ricos - os novos senhores, "reis que não prestaram juramento nem nos conduziram a nenhuma batalha". O capitalismo pode ser tão ateu, tão desalmado e tão perverso quanto o comunismo: mastiga as pessoas antes de as expelir. Ao dissociar "corpos" e "almas" o sistema esvazia o conteúdo autêntico da vida humana, transformando-a em mera rotina para o incremento da lucratividade do capital. Não é por acaso que este foi o único livro de Chesterton não publicado inicialmente em Inglaterra – ai daqueles que ousam condenar o supremo "casal" capitalismo/comunismo e propor uma alternativa superadora! Ao contrário do que as pessoas normalmente pensam, muito capitalismo não significa muitos capitalistas – significa, sim, poucos. O processo de concentração do capital materializado na hegemonia das mega-empresas e dos mega-bancos que controlam os mercados, com estes, por sua vez, cada vez mais unificados, trazem à mente o Distributismo concebido Chesterton e Belloc. A partir da condenação simultânea do capitalismo liberal e do socialismo colectivista, os dois apologistas católicos formularam uma alternativa baseada na pequena propriedade familiar, no trabalho do artesão, no regresso ao campo e à natureza. E por falar em capitalismo liberal e socialismo colectivista, parece que a História vai confirmando que tanto um como o outro são, de facto, irmãos, filhos do mesmo papá e da mesma mamã. Com o primeiro suga-se tudo, com o segundo envenena-se. Esta tem sido a receita infalível de uma certa elite mundial animada por aquilo a que o grande Padre Meinvielle chamou “um desejo insolente de dominação”. Conhecer bem o inimigo é a primeira lição. Não ter medo de o enfrentar é a segunda.
Até para a semana, se Deus quiser.
Marcos Pinho de Escobar
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