CIÊNCIA E RELIGIÃO EM OXFORD
Passo a transcrever, com a devida vénia, um interessante e importante texto de João Carlos Espada, publicado no Expresso. Chegou-me por e-mail, enviado por Pedro Aguiar Pinto, a quem agradeço.
A crença dogmática na razão constitui o cerne daquilo que Raymond Aron designou por ópio dos intelectuais
Entre 14 e 16 de Setembro, decorreu o primeiro fim-de-semana dos antigos alunos da Universidade de Oxford - o primeiro em 800 anos, deve talvez ser referido. Até esta data, a Universidade nunca tinha organizado uma iniciativa central para antigos alunos. Todos os anos, ou de dois em dois anos, cada colégio organizava os seus próprios encontros, o que continuará a acontecer.
Cerca de mil pessoas compareceram, o que não é seguramente muito. A par de uma organização impecável, era sensível a tensão entre a direcção central da Universidade e os colégios. Alguns simplesmente não participaram no evento. Outros limitaram-se a uma breve recepção de boas-vindas. Ainda assim, o programa foi intenso, com palestras e debates para todos os gostos.
O tema central do momento, a que fiz referência neste espaço a 18 e 25 de Abril, é sem dúvida o da relação entre ciência e religião. Uma avalancha de livros sobre a matéria ocupa os lugares de destaque nas inúmeras livrarias. Várias palestras abordaram o tema durante o fim-de-semana.
Oxford é talvez particularmente sensível a este debate - que, no entanto, ocorre também pela Europa - porque dois professores da casa lideram campos opostos. Richard Dawkins desferiu um exaltado ataque à religião no livro ‘The God Delusion’. Alister McGrath acaba de responder serenamente em ‘The Dawkins Delusion? Atheist fundamentalism and the denial of the divine’. A formação científica de ambos torna o confronto especialmente desafiante.
No plano político, o principal ataque à religião foi desferido por Christopher Hitchens em ‘God is not Great: The case against religion’. Em minha opinião, é um livro vulgar que ignora de forma surpreendente a matriz cristã da civilização ocidental - que o autor diz defender. Esta matriz cristã é eloquentemente recordada num grande livro do nosso amigo Robert Royal, ‘The God that did not fail’.
Um dos aspectos intrigantes deste debate reside na diferença de tom entre os dois campos. Os ateístas escrevem com ardor e zelo, acusando a religião de ardor e zelo. Os cristãos respondem com serenidade, acusando o ateísmo de dogmatismo fundamentalista.
Sem prejuízo de um exame mais detalhado, que este espaço não permite, a diferença de tom ilustra algo mais fundo: uma diferença de atitude. Enquanto os cristãos sabem que acreditam, os ateístas acreditam que sabem - sem saber que acreditam. Esta crença dogmática na razão constitui o cerne daquilo que Raymond Aron designou por ópio dos intelectuais.
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