sábado, 26 de abril de 2008

DA GINÁSTICA GENEALÓGICA

Em jantar social recente, fui encaixado entre duas jovens senhoras. Sabendo eu que o anfitrião, todo ele protocolar e palaciano, não dá ponto sem nó, calculei logo haver afinidades entre nós os três. Confrontado com os nomes — ilustres, mas de paragens distantes — das bonitas vizinhas de mesa, não vislumbrei qualquer ligação a mim, nem à minha gente. Estranhei então que se referissem ambas a antepassados meus, com familiaridade, contando episódios do Alentejo de outras eras. Depois de vários exercícios de ginástica mental da minha parte, solitários e sem sucesso, não hesitei mais, e perguntei-lhes quem eram. Afinal, tratava-se de irmãs — uma loira, outra morena —, e de uma família que conviveu com a minha ao longo de várias gerações; mas, como ostentavam orgulhosamente os apelidos dos senhores seus maridos, longe estava eu de poder adivinhar quem eram. Tudo isto me levou a concluir, mais uma vez, que triste é este hábito, introduzido pelo liberalismo e consagrado pela república, das senhoras adoptarem o nome dos maridos e deixarem cair o do seu sangue — de pai, mãe, e avós. Assim, arriscamo-nos a falar uma noite inteira com primos, sem o saber. Mudem lá isso!