segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

EXPRESSO DO OCIDENTE

Segunda-feira, 21 de Fevereiro
Um desafio: imagine o leitor que no final da semana passada, em precisando de um atestado médico, se deslocava ao Centro de Saúde e, desconfortável com a previsível demora, mandava às malvas as senhas e a ordem de chegada e entrava pelo consultório dentro exigindo o despacho rápido da médica de família. Imagina o desfecho? Assim de repente, eu arriscaria o insucesso da missão fosse em virtude da rápida intervenção do segurança ou por via dos restantes pacientes que, presumia eu, não achariam graça à brincadeira. O certo é que me equivoco: vejo agora que na semana passada o extraordinário Armando Vara (cada vez mais um caso de polícia), assegurou justamente o êxito do feito perante a inacção do segurança e da médica. Já os demais pacientes, ao invés do que mandaria o bom-senso - ir atrás do sr. Vara e metê-lo por uma orelha no final da fila -, optaram (os que optaram...) por uma reacção extraordinária: denunciar o episódio à TVI! Ora pensem na opção tomada pelos "populares" e constatem o absurdo de boa parte da concepção moderna da existência: não resolver coisa alguma mas mostrar a patifaria em horário nobre. Assim vamos...
Em dia dedicado à saúde, cabe dizer que com igual insanidade segue a cruzada anti-tabágica. Por estes dias, nas vésperas do Estado de Nova Iorque decretar a proibição de fumar em jardins e praças ao ar livre (coisas que interessam porque por via de regra estas modas americanas tendem a cruzar o oceano), ficamos agora a saber que a interpretação da lei que por aqui temos vai no sentido de decretar a impossibilidade de uma pessoa fumar um cigarro na sua própria casa se a mulher-a-dias por lá estiver a passar as calças a ferro. Extraordinário! Agrada-me a preocupação desta gente para connosco, iluminados a quem devemos a alegria de poder morrer cheios de saúde!
Terça-feira, 22 de Fevereiro
Está confirmado: a CDU da senhora Merkel perdeu as eleições de domingo em Hamburgo, primeiro de seis actos eleitorais estaduais que neste ano de 2011 vão provocar cabelos brancos à líder germânica e entreter um povo que, estimo eu, talvez esteja um nadinha farto de trabalhar para pagar as tropelias do nosso brilhante Engenheiro e do "socialismo democrático" que, como é sabido, se constitui como uma doutrina que corre sobre rodas enquanto há dinheiro para rebentar distribuindo em paralelo mais algum pelos muitos boys que gravitam em torno da causa. Tudo isto na mesma altura em que, garantem as gazetas, a despesa do Estado conseguiu crescer em Janeiro. Trocado por miúdos: os rapazes subiram freneticamente taxas e impostos, desceram em proporção idêntica salários e apoios e... mesmo assim... terão logrado gastar mais dinheiro. Ora, em chegando tal feito aos pasquins alemães pode até dar-se o caso de ser a senhora Merkel a não chegar ao fim deste ciclo eleitoral.
Quarta-feira, 23 de Fevereiro
A coisa não espanta mas não só merece como exige referência: na Assembleia da República, PS e PSD entendem-se às mil maravilhas - como aliás sucede em tudo o que é relevante - para inviabilizar projectos da oposição parlamentar que visavam no essencial equiparar os salários dos gestores públicos ao vencimento do Presidente da República. Convinha que os nossos patrícios se detivessem no facto por um minuto: sempre que o objectivo é ir ao nosso bolso, e mais ainda se se trata de defender o bolso das enormes legiões de aparelhistas e outros inúteis que enchem os agrupamentos da rosa e da laranja, Sócrates e Passos Coelho entendem-se na perfeição. É assim há décadas, foi assim nos PEC's a que já perdemos a conta, foi assim no Orçamento que nos estrangula o final de cada mês, será assim sempre e quando estiverem em causa os interesses particulares do "arco constitucional". Arriscaria que, salvo os inúteis visados, não se encontra na rua um único português que não reconheça a validade da tese. Mas arriscaria de igual modo que, em próximas eleições, esses mesmíssimos portugueses a quem foram à carteira mais os da "Geração à rasca" que aparentemente não chegam a constituir carteira, vão sufragar em massa essas mesmas opções, as caras e os interesses de sempre. Aposto que foi a pensar nisto que os Deolinda deram largas àquela coisa do "Parva que sou".
Quinta-feira, 24 de Fevereiro
O país está hoje em polvorosa com a intervenção de um grupo de Operações Especiais na cadeia de Paços de Ferreira. Os factos (e as imagens) são do conhecimento público dado que alguém com acesso ao documento raciocinou no mesmo quadro mental dos utentes do Centro de Saúde do sr. Vara: se a coisa não aparece na televisão não existe... As imagens são fortes, reconheço, com um indivíduo que manifestamente não joga com o baralho todo a ser alvejado por uma arma "Taser" que está na posse do grupo de intervenção constituído por homens fortemente armados (e escudados pelo Incrível Hulk!...). Confesso que estando longe dos amplos dotes e conhecimentos do Prof. Marcelo - que tudo abarcam do Direito Constitucional até à utilização do fio telefónico pelas tribos da Papua -, não me é fácil ter opinião sobre o assunto para além daquilo que manda o bom-senso. Há no entanto duas notas que não posso deixar de alinhavar a respeito e que têm a ver com a má semana das polícias e com a clara incapacidade do ministro da Administração Interna para ocupar a pasta. Com efeito, já na noite de segunda-feira as televisões nos ofereciam imagens espantosas em que o Corpo de Intervenção, depois de resolver carregar sobre uma bancada de um estádio de futebol, se viu obrigado a bater em retirada, tipo fuga, posto que a malta não reagiu com a mesma pacatez verificada em Paços de Ferreira. Convenhamos que o filme, para os que se preocupam com a imagem e a autoridade do Estado, é penoso até para quantos, como eu, frequentam amiúde os estádios deste país e bem conhecem os inacreditáveis impulsos policiais que muitas vezes incendeiam ambientes já de si quentinhos. Pior, só mesmo os responsáveis da Administração Interna (que, a despropósito, se devia chamar Interior posto que não é possível constituir a pasta da Administração Externa): sempre prontos a seguir o que pensam ser a maioria da "opinião pública", os cavalheiros logo anunciam um mar de inquéritos e comissões enquanto, nas entrelinhas, passam uns raspanetes às forças policiais. Esta gente que mais directamente simboliza o Estado é, curiosamente, um espelho fiel do estado a que isto chegou.
Sexta-feira, 25 de Fevereiro
No mar e nos rios, as televisões oferecem-nos imagens de manifestações de pescadores. Queixam-se de terem passado a ser obrigados a pagar 118€ para a Segurança Social à cabeça, tipo pagamento por conta, mesmo nos meses em que não vão ao mar. Para um País de Marinheiros e num sector que já foi nobre e que já foi grande mas que é parente pobre da estratégia nacional desde a adesão à União Europeia com a prestimosa ajuda do actual Presidente da República, eis mais uma machadada por via do pacote "Código Contributivo" que, para variar, merece o beneplácito do PSD.
Sábado, 26 de Fevereiro
Não bastando a má semana das polícias, o Expresso dá-nos a tropa por via da publicação dos célebres telegramas da estranhíssima Wikileaks que garante que gostamos de comprar armamento como quem compra brinquedos. Para mais, diz-nos o semanário do dr. Balsemão que os factos narrados pelo embaixador americano em Lisboa dizem como segue: "Portugal tem mais generais e almirantes por soldado do que quase todas as outras forças armadas modernas: 1 para cada 260 soldados. Em comparaão, os Estados Unidos têm um rácio de 1 para cada 871 soldados", além de "170 generais adicionais que recebem o ordenado por inteiro enquanto se mantêm inactivos na reserva".
A gente lê isto e lembra-se logo do nosso Rodrigo Emílio: "Tanta farda e fardeta / e treta, treta e mais treta"...
Pedro Guedes da Silva