segunda-feira, 20 de junho de 2011

EXPRESSO DO OCIDENTE

Quarta-feira, 15 de Junho
Segue ao rubro a novela dos votos chegados dos círculos da emigração. Parte do sistema - no caso rosas e laranjas consoante o consulado seja o do Rio de Janeiro ou o de São Paulo - acena com a fraude. Se são eles que o dizem, quem somos nós para os contrariar?...

Quinta-feira, 16 de Junho
À noite, na SIC Notícias, perco algum tempo a espreitar o Flashback e não dou o tempo por perdido. Talvez por estar pouco convencido da excelência do que está para chegar, a argumentação de António Lobo Xavier não tem desperdício: afinal de contas e a fazer lembrar as constantes fugas à responsabilidade de Sócrates, para o ex-dirigente centrista o novo executivo até pode fazer tudo o que tem a fazer e mesmo assim provocar o tombo da Pátria no precipício da bancarrota, posto que o impacto do que vem de fora pode ser demasiado pesado. Traduzido para português corrente: podemos ser assaltados de sacrifícios nos próximos quatro anos e tudo isso poderá bem ser insuficiente à gula dos "mercados" e dos nossos amigos da Europa central. Entendo o que Lobo Xavier pretende transmitir e tendo até a concordar com parte do que diz, mas não deixa de ser sempre delicioso observar as mais notáveis individualidades deste engraçado sistema a dizer hoje o contrário do que juravam na véspera das eleições que, como está bom de lembrar, decorreram há apenas quinze dias. Perante os sorrisos de António Costa, o social-democrata Pacheco Pereira - a quem gabo alguma coerência neste tipo de coisas - ainda o tentou chamar aos domínios da razão. Naturalmente sem sucesso.

Sexta-feira, 17 de Junho
Por esta altura, estão os meus caros amigos convencidos de que eu só digo mal da situação nela não lobrigando nada de aproveitável. Nada mais falso e injusto. Para o provar e conhecido que é o novíssimo gabinete, proponho-me lavrar desde esta tribuna duas esperanças de primeira hora. Desde logo na Cultura - com caixa alta, elemento menor desta república das bananas mas de que manifestamente Portugal carece como de pão para a boca. Confesso desconhecer em absoluto as ideias de Francisco José Viegas para o sector mas ainda assim, com o peito feito de boa vontade, declaro o meu agrado pela escolha. Obviamente, a leitura obrigatória e já antiga dos policiais do autor a isso ajuda. Se governar como (d)escreve as paisagens açoreanas ou as derrotas do Benfica, já estamos muitos furos acima do habitual. A par, recebi também com satisfação e significativa abertura de espírito a selecção de Nuno Crato para a Educação Nacional. Habituei-me a escutá-lo com atenção nas suas múltiplas intervenções televisivas, dedicando igual curiosidade pelos seus escritos pelo que - mesmo dando de barato as várias convergências a que o exercício do poder obriga e as muitas fenprofs que é preciso aturar - dele espero que, no mínimo, se aumente um pouco o nível de exigência. Que haja disciplina e exames, que haja chumbos quando necessário, que se dificulte a vida ao facilitismo, que se premeie o mérito de quem se esforça, que o romantismo pós-moderno de muitos pedagogos da 5 de Outubro seja alvo de um claro travão às quatro rodas. A respeito desta escolha de Nuno Crato permito-me sugerir a quem por aqui passa uma leitura adicional: Divagações acerca do livro de Nuno Crato "O eduquês em discurso directo - Uma crítica da Pedagogia Romântica e Construtivista", texto assinado por José Lúcio na Alameda Digital faz agora cinco anos.
Já quanto ao resto, que começou com a escolha de um Chefe de Gabinete para Passos Coelho que provém dos gabinetes ministeriais socráticos - o sistema no seu normal… -, não espero grande coisa para além daquilo a que já temos vindo a ser habituados. Alguma curiosidade apenas pelo exercício na pasta da Saúde, cujo novíssimo titular não me provoca o entusiasmo que vejo em alguns círculos; confesso na verdade que o meu apreço pelo terrorismo fiscal que o tornou célebre não é especialmente significativo. Para além disso, duas incógnitas nas Finanças e na Economia além dos habituais aparelhistas. Uma certeza: como diria Paulo Futre, vai vir cortes a torto e a direito…

Domingo, 19 de Junho
De Atenas chegam notícias da subsistência do caos por onde, desesperado, o primeiro-ministro apela ao apoio do seu próprio partido - cada vez mais estilhaçado -, dos grupos da oposição e do povo. Este último, que voltou há poucos dias a encher as ruas de dezenas de cidades gregas manifestando-se firmemente contra o centésimo terceiro (mais coisa, menos coisa) pacote de austeridade, dá sinais cada vez mais evidentes de não estar disponível para continuar a pagar por muito mais tempo a incompetência dos políticos - o que equivale por dizer que está farto de ser comido por parvo. No plano internacional, o impasse dobra o pânico nos "mercados" o que de imediato se sente nos juros que pagamos todos e que insistem em bater recordes não obstante a excelência do novo governo. A verdade é que o sistema pode ver-se grego, ora vejamos: o Banco Central Europeu inscreve no seu balanço 50 mil milhões de euros de títulos gregos, valor que aumenta para os 70 mil milhões se pensarmos na banca grega que, por sua vez, controla os bancos privados de alguns dos países da Europa de leste. Por sua vez, a exposição dos bancos alemães ao problema grego atinge os 34 mil milhões, menos 12 mil milhões do que o valor de risco em que incorrem os seus congéneres franceses. Em paralelo, os cidadãos gregos que ainda detêm algumas economias e que não são tão tolos como se crê já fizeram sair do país 13 mil milhões de poupanças, só no primeiro semestre deste ano. Um mimo, verdadeiro caldo a prenunciar o êxito da missão e, quem sabe, o futuro do euro que cada vez em menor número nos chega aos bolsos. Há quem garanta que olhando para a Grécia antevemos o nosso próprio futuro. Pois bem, preparem-se...

Pedro Guedes da Silva