segunda-feira, 31 de outubro de 2011

EXPRESSO DO OCIDENTE

Quinta, 27 de Outubro
Prossegue nas televisões lusas - e acredito que neste particular o mal não seja só nosso - o deplorável espectáculo da multiplicação de vídeos que mostram os últimos momentos do coronel Kadhafi, velho amigo do nosso mui estimado engenheiro Sócrates e de mais uma série valente de líderes desta coisa em que o Ocidente se vai vendo transformado. Sejamos claros: a imagem da prisão de Kadhafi, mesmo se de fraco gosto, seria aceitável; já a sucessão de agressões selvagens, os pormenores "sado-maso" captados por telemóveis de última geração (a dar que pensar sobre quem realmente estava no terreno e se quem estava coincide de facto com a história que nos tentam vender), e o "fim de festa" com fogo cruzado acompanhado de gritaria exaltando a grandeza de Alá são imagens reveladoras do estado de barbárie (e voyeurismo reles, tipo Casa dos Segredos) a que isto chegou. Pior ainda se pensarmos que tudo isto pode bem ser o prenúncio do que aí vem e que aquilo que aí vem - e só vem porque houve intervenção directa (e provavelmente irresponsável) da NATO e da Europa - é muito provavelmente um Estado islâmico pouco amigo de quem o "libertou", mesmo ali a dois mergulhos do Sul de Itália.
Ainda no âmbito do pior da natureza humana, verifico que Paulo Campos - o socialista que na era socrática somou responsabilidades naqueles magníficos negócios das já famosas parcerias público-privadas - se apresentou no parlamento onde agora deputa para mostrar a injustiça das acusações que sobre ele se amontoam. E, não fora dar-se o caso - manifestamente injusto, já se vê - dos contribuintes não acreditarem numa vírgula do que o ex-secretário de Estado ali dizia, o sr. Campos socorreu-se de inúmeros gráficos e estatísticas em papel timbrado da KPMG que, aparentemente, provariam a excelência da sua governação. Digo provariam na medida em que, imaginem os meus amigos como isto anda, logo veio um administrador da afamada empresa auditora assegurar que a KPMG não teria produzido um único dos muitos bonecos que o sr. Campos havia apresentado ao país. Um mimo de novela para quem já sentia saudades das melhores trapalhadas dos tempos de Sócrates, prova cabal da seriedade desta gente que nada seria sem a política e que mostra bem o sarilho em que, enquanto Nação, estamos metidos.

Sexta-feira, 28 de Outubro
Se Paulo Campos grita a plenos pulmões para se defender das fortíssimas acusações que lhe são dirigidas - chegando como vimos a mostrar documentos que afinal não existem, na linha das melhores prestações do dr. Vale e Azevedo -, Duarte Lima faz exactamente o contrário. Acusado de homicídio pelas autoridades brasileiras, pronto a engrossar as listagens da Interpol e previsivelmente impedido de ultrapassar os limites do Caia ou de Vila Verde de Ficalho, o ex-dirigente social-democrata, figura relevante da política portuguesa desde os tempos dos governos de Cavaco Silva e dos seus fieis escudeiros Dias Loureiro e Oliveira Costa, permanece mudo e sem que alguém lhe consiga colocar a vista em cima - além de permanecer também rico, ao contrário do país que ajudou a enterrar em responsabilidades partilhadas de mais de trinta anos de governos irresponsáveis. Eu já não digo que a criatura devesse apanhar o primeiro avião para o Brasil para aí se defender. Mas caramba, pelo menos uma conferência de imprensa em que garantisse a sua inocência e, já agora, em que acalmasse as hostes laranjas. Agora assim, debaixo de alguma toca tipo recluso fugido da cadeia…

Domingo, 30 de Outubro
Circula pelo Facebook um interessante vídeo onde é possível ouvir Ângelo Correia, velho barão do bando laranja e um dos inventores deste Passos Coelho que agora nos alivia a carteira, a discorrer alegremente sobre a problemática dos "Direitos Adquiridos". Ficamos então a saber que para a desavergonhada criatura trabalhador algum poderá invocar como "Direitos Adquiridos" os subsídios de férias ou de Natal, o valor do seu próprio salário ou qualquer regalia de que usufruem enquanto contribuintes líquidos para o chamado "Estado Social". Mas, pasme o caro leitor - ou talvez não… -, ficamos igualmente a saber que a subvenção vitalícia atribuída aos políticos e que o sr. Correia candidamente abicha a troco dos altos serviços prestados à Pátria não pode ser alterada, na exacta medida em que, aí sim, estamos na presença de um caso evidente dos tais "Direitos Adquiridos". É justamente ao ver e ouvir estas almas descaradas que eu me torno um nadinha mais revolucionário. Ainda não perdi a esperança de que a generalidade do país me possa, um dia, acompanhar na indignação.

Pedro Guedes da Silva