CARTEIRA DE SENHORA
DIA 19
Hoje nem olhei para a
carteira. Quem manda sou eu, e já tinha tema escolhido. Por isso, vão
estranhar. É diferente (porventura para pior), mas se a senhora não mostra de
vez em quando que é dona da carteira, qualquer dia é a carteira a dona da
senhora.
O João Marchante,
dono e senhor deste paço/blogue, fez uma exposição de trabalho seu. Fotografia.
Nem sonhem que vou aqui fazer uma crítica ao trabalho. Não sei. Muito menos a carteira.
Sabemos que gostámos, mesmo que pareça suspeito.
Uma série de
fotografias gigantes de uma adolescente em vários ambientes/cenários posando
(mesmo!) em actividades do dia-a-dia que aparentemente seriam normais, mas onde
o João pôs sempre elementos contraditórios com a adolescência (que é também a
altura das contradições, nem criança, nem adulto) ou com a actualidade. Uma
menina em actividades que podiam ser as suas mas com elementos de adulto ou de
outra época. Retratos/janelas que representam a própria adolescência, a fase da
terra-de-ninguém. Foi o que vi e “li”. Outros terão visto e “lido” outra coisa
qualquer, mas é assim mesmo, a arte. São os nossos sentidos que lhe dão forma.
Disse ao João que
iria escrever sobre o ambiente. O que é que me passou pela cabeça? Vou
confessar-vos uma coisa: esta “artista” convidada não conhecia pessoalmente o
dono deste castelo. Só pode ter sido o nervosismo que me fez dizer aquilo.
E agora? É
quinta-feira, último dia de Corpo de Deus como feriado, são 19 horas e 36
minutos e não sei. Entretanto, 21 horas e 8 minutos, e na mesma.
O espaço escolhido
foi uma sala do Museu de História Natural e tanto o edifício como os que o
rodeiam proporcionam um ambiente único, muito séc. XIX, que contrasta bem com o
contemporâneo. Os ingredientes que fazem com que o bolo tenha a cereja no topo
estavam lá todos e eram de boa qualidade: a comida, a bebida, a música… Bastou
juntar a cobertura de chocolate, as pessoas, e claro que só podia correr bem.
Acabei de imitar uma
revista cor-de-rosa.
Não sou nada perita
em vernissages, fui a muito poucas na
vida. Não quer dizer que não possa fazer as minhas habituais generalizações com
o desplante a que já se habituaram. Por isso, vou passar a vias de facto, e
dissertar não sobre esta em particular, mas como é costume, sobre todas as
outras.
Primeiro a família do
artista. Vem sempre. É o apoio seguro, incondicional. Depois os amigos, o outro
pilar. São estes a principal animação. Apoio incondicional não quer dizer
aplauso. Os pilares estão tão seguros que se permitem dizer mal se for preciso.
Não caem.
Fora destes dois
círculos há toda uma série de pessoas que vão às vernissages. Dos conhecidos aos desconhecidos, dos críticos aos
curiosos. Os discretos e tímidos não vão à inauguração. Vão depois.
Entre os que gostam
de ir ao primeiro dia do resto da vida de uma exposição, encontram-se várias
espécies, famílias ou géneros. Os que entram para sair logo. Os que ficam até
serem expulsos. Os que vão pela comida. Os que vão pela bebida. Os que não
percebem nada (como eu) e se armam em críticos. Os que percebem imenso e logo
ali utilizam aquela linguagem hermética que lhes é particular e que não ajuda
nada os que não percebem. Os espontâneos. Os que pensam que estão na praia. Os
que se vestem à artista. Os que adoram o social. Os solitários.
Voltando à
inauguração da exposição do João Marchante, nem sei se lá estavam todos estes
ou só alguns. Sei que o João estava resplandecente, cirandando por todo o lado,
feliz da vida. Parabéns, João!
Ninguém me mandou ir
de saltos altos. Manias.
Leonor Martins de
Carvalho
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