sexta-feira, 9 de novembro de 2012

CARTEIRA DE SENHORA

DIA 41

Numa das viagens a carteira enjoou, sendo agora, provavelmente, a única utilizadora mundial dos apropriados sacos de papel que as companhias aéreas tão precavidamente têm à disposição naquela espécie de bolsa no banco do senhor da frente. A senhora do lado espreitou pelo canto do olho, entre incrédula e enojada, mas à falta de explicação racional decidiu-se pela cautelosa posição “deixa-me lá fingir indiferença, não vá isto ser possível e afinal ser eu a ignorante”. Para além deste percalço, fui obrigada pela segunda vez a escrever uma crónica, ou grande parte dela, num avião. Já faltou mais para a renomear “crónica de uma carteira voadora”.

Nem só de política vive esta crónica porque dela também não vivem os homens. Nem as carteiras. Aliás, contemplando de um alto com boa vista a medíocre (para não dizer péssima) qualidade dos políticos demonstrada ao longo dos anos, bem pior estaríamos se assim fosse. Vivemos mal também por causa da política mas vivemos, felizmente, para além dela.

Se alguns dos princípios, valores, preceitos morais ou como lhes queiram chamar, que deviam reger o nosso dia-a-dia fossem replicados na política, acredito que o mundo andaria bem melhor.

Será esse afinal o problema? É o facto de na nossa própria vida já ninguém se guiar por princípios e valores, morais, éticos, religiosos ou outros? Será um problema geracional? Será que apenas alguns são afectados e logo por mero acaso fazem parte da classe política? Ou é vírus geral? É então por ser geral que temos os políticos que merecemos? São apenas espelho do que é hoje o povo português? E será mesmo assim tão difícil ter valores na política? Será que os jovens entram na política cheios de boas intenções, bons princípios e boas vontades e só depois são “formatados”? Ou a ausência de valores já é condição sine qua non da sua estreia?

O teste é americano de escolha múltipla, admitindo várias respostas.

Costumo dizer que falta, a muitos dos que se movimentam naqueles becos obscuros da política, terem andado na catequese. Mal não lhes tinha feito e talvez ficasse qualquer coisa parecida com uma consciência naqueles cérebros. Uma consciência que parece fazer igualmente falta a muitos outros…

Afinal, que valores deveriam existir nessas altas esferas? Assim de repente, voam da minha caneta uns tantos, se bem que uns possam abranger os outros: honra, palavra, honestidade, carácter, humildade, lealdade, verdade, serviço…

Sem valores, ou com eles distorcidos sobretudo pelo egoísmo e pela ganância, teremos como resultado apenas canibais. Desaparece até o que nos caracteriza como seres humanos. Já se nota.

Não tinha qualquer intenção que um tema político voltasse à baila tão cedo. Entrou sem pedir licença. Hoje em dia é o que acontece. A falta dos tais valores…

Leonor Martins de Carvalho