quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

DO INTEGRALISMO LUSITANO (III)

A restauração da Monarquia, — ponderava já De La Barre de Nanteuil — , não é simplesmente a restituição do poder ao rei, mas a restauração de todas as leis fundamentais do povo. Pois, exactamente, nas «leis fundamentais» do povo, é que a nossa Monarquia tradicional assentava a sua razão histórica de existir. Não pensemos, de modo nenhum, em que seriam preceitos escritos, formando o que em boa mitologia política se convencionou chamar uma «constituição». Saídas de vários condicionalismos, tanto sociais como físicos, duma nacionalidade, formariam, quando muito, pelo consenso seguido das gerações, a observância dos princípios vitais da colectividade, — Família, Comuna e Corporação, ou seja Sangue, Terra e Trabalho, cujo conjunto admirável Le Play designaria de «constituição-essencial».
De «Monarquia limitada pelas ordens», classificaram os tratadistas portugueses a nossa antiga Realeza. Correspondendo às forças naturais da sociedade, organizadas e hierarquizadas em vista ao entendimento e bases do comum, as «ordens» do Estado eram, a dentro dos seus foros e privilégios, as depositárias natas dessas «leis fundamentais». Cada associação, cada classe, cada município, cada confraria rural, cada behetria, possuía na Idade Média o seu estatuto próprio, a sua carta de foral. Legislação positiva destinada a normalizar e a coordenar as exigências da vida quotidiana, tomava o «costume» por base e consagrava a experiência como sua regra inspiradora.

António Sardinha, A Teoria das Cortes Gerais — Prefácio a Memórias para a História e Teoria das Cortes Gerais, do 2.º Visconde de Santarém, Biblioteca do Pensamento Político, Lisboa, 1975 (2.ª edição).