CADERNOS INTERATLÂNTICOS (1)
Quis o bom Amigo João Marchante, na sua inexcedível amabilidade,
oferecer-me espaço nesta sua Casa para, uma vez por semana, aqui deixar algumas
pinceladas do que me vai no espírito, reacção ao que foi, ao que é, e ao que –
julgo - pode vir a ser. Aqui e algures…
Reflexões, comentários, estados d´alma, um ou outro mot d´ordre, desabafos e até mesmo alguma lamentação quase fadista,
fica desde já assentado que cada palavrinha ou palavrota aqui debitada será da inteira
responsabilidade deste vosso modesto mas atrevido escriba.
Pois é tempo de visitas argentinas. No espaço de duas semanas procuro dar a
conhecer a amigos porteños alguns
tesouros do Portugal eterno (o Grande), tão teimoso na sua resistência aos embates
do anti-Portugal (o Portugalinho versão cravícola). Do Castelo de São Jorge ao
Mosteiro da Madre de Deus, de São Vicente de Fora aos Jerónimos, do Convento
dos Cardaes ao Museu Nacional de Arte Antiga, da Fundação Ricardo Espírito
Santo ao Museu dos Coches, de Queluz a Mafra, de Sintra a Óbidos, da Batalha a
Alcobaça, etc. E que dizer de duas deslocações ao Santuário de Fátima para orar
no local onde a Santíssima Virgem tantas vezes visitou e abençoou esta Terra de
Santa Maria!
Escusado será dizer que maravilharam-se com o que viram. Gente bem formada e bem informada,
demonstraram ser observadores atentos ao comentar, por exemplo, os seguintes
pontos:
1.º Na Patriarcal, nesta jóia
que é São Vicente de Fora, ao percorrer atentamente os grandes painéis com a
cronologia ilustrada da Igreja portuguesa, chamou-lhes a atenção o facto de
Salazar – “com quatro décadas entregues à restauração material e moral de sua
Pátria” – ser contemplado com uma curta frase a referir a nomeação como
Ministro das Finanças em 1928, enquanto Spínolas, Costas Gomes, Soares e demais
“coveiros de Portugal” merecem extensos textos e imponentes fotografias. Por essas e por outras é que a Igreja
conciliar dá muito, mas muito mesmo, que falar…
2.º No Mosteiro da Batalha, precisamente
no Museu das Oferendas ao Soldado Desconhecido (Liga dos Combatentes), em
secção destinada aos “grandes políticos e militares de Portugal”, espantaram-se
ao constatar que o selecto grupo compunha-se de notórios liberais e maçons,
como o Imperador Pedro I do Brasil mais os Saldanhas e Terceiras do costume,
além de revolucionários abrilinos do estofo de um Spínola, um Costa Gomes, um
Ramalho Eanes e – pasmai ó gentes! – o inevitável e desavergonhado
“descolonizador exemplar”.
3.º No belíssimo Museu dos
Coches, prestes a ser transferido para um caixote branco modernaço, fruto sabe-se lá de que negócio, repararam que se um
retrato de El-Rei D. Miguel encontra-se na galeria superior, já a colecção de
postais com os retratos dos Reis da dinastia brigantina, que se encontra à
venda na loja do museu, omite escandalosamente o “mais português” e “mais
católico monarca da Cristandade”.
Onde está a reacção a um tal estado de coisas? De facto, o espectáculo em Portugal
é confrangedor: dir-se-ia que o inimigo conseguiu neutralizar aqueles que não
afinam pelo mesmo diapasão. Nenhuma
publicação periódica, nenhuma editora, nenhuma livraria, nenhum programa de
conferências de peso, nenhuma iniciativa de doutrinação séria e sistemática,
nenhuma acção concertada para fazer frente ao regime da dissolução nacional.
Urge seguir o exemplo que nos vem do país dos argentinos, onde um revisionismo
histórico pujante e corajoso não apenas restaura factos, valores e personagens
do passado, mas reactualiza-os na sua urgência presente.
Marcos Pinho de Escobar
<< Home