sexta-feira, 14 de junho de 2013

CARTEIRA DE SENHORA

DIA 71
De férias, a carteira esforça-se na preguiça dos dias por me providenciar um papelinho com tema digno. Então, sobre dignidade será. 
Diz o dicionário, o pequeno dicionário de Cândido de Figueiredo, que aqui mora numa das prateleiras e também lá em casa, que dignidade, herdeiro do latino dignitas, é um substantivo feminino (nestas novas gramáticas ainda existe tal coisa, o substantivo?) que, entre outros significados, quer dizer qualidade daquele ou daquilo que é nobre e grande, modo de proceder que se impõe ao respeito público, respeitabilidade, pundonor, seriedade, autoridade, nobreza. 
Já agora, digno, no mesmo útil volume, é um adjectivo (também não morreram os adjectivos?) procedente do latim dignus, que significa merecedor, apropriado, que tem dignidade, honrado, exemplar, ilustre, que vale a pena, hábil, habilitado, capaz. 
Em resumo, quase tudo o que esperamos de quem nos governa. Verifica-se facilmente que bem podemos esperar sentados. 
Desterrada no Portugal profundo que amo, parece-me ver com mais discernimento a loucura instalada que perigosamente já é considerada estado normal. Vale tudo. Pelo poder e pelo dinheiro, na esperança ávida de que um traga o outro. Não interessam capacidades, seriedade ou honradez. Até as boas vontades acabam sugadas.
Gente que se verga mais que uma seara batida a vento. Que se derrete parolamente com loas estrangeiras quando já todos sabem ao que vêm. Que destrói o país real que desconhece, celebra negócios obscuros (quão brando é este adjectivo…) e vende tudo ao desbarato, incluindo a própria língua.
Depois até se denunciam mutuamente, mas o que uns fazem, os outros só fingem que desfazem.
Dignidade têm os portugueses que aturam esta gentalha. Os portugueses que não baixam os braços, que trabalham esforçadamente no dia-a-dia, que emigram, que tudo fazem para tentar prover ao seu sustento, que ajudam os mais fracos, que se unem em causas nobres.
Tomara uma migalha desta dignidade em cada um dos que nos desgoverna há muito. São esses os indignos perante a Nação que somos.
Saibamos conservá-las, a nossa dignidade e a de Portugal. Já que muitos não o são, sejamos nós dignos do país, da sua História, dos nossos avoengos e dos vindouros, dando-lhe assim também a dignidade merecida.
Leonor Martins de Carvalho