sábado, 31 de dezembro de 2011

PARA O ANO NOVO NÃO VAI NADA?

Saúde e Trabalho. É o que desejo aos meus leitores.

sábado, 24 de dezembro de 2011

RENOVADOS VOTOS DE SANTO E FELIZ NATAL PARA OS MEUS LEITORES E SUAS FAMÍLIAS

O Menino Jesus Salvador do Mundo, 1673
JOSEFA DE ÓBIDOS (1630 — 1684)
Óleo sobre Tela, 95 x 116,5 cm
Igreja Matriz de Cascais

SUBLIME MÚSICA DE NATAL

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

LEITURAS DE NATAL

Natal... Natais — Oito Séculos de Poesia sobre o Natal, antologia organizada por Vasco Graça Moura, edição do jornal Público, Lisboa, 2005.
Livro obrigatório numa biblioteca portuguesa. Poemas de Natal, da autoria dos melhores Poetas Portugueses, numa bela edição, com capa dura e tudo.

Pequeno Presépio de Poemas de Natal, Rodrigo Emílio, Antília Editora, Porto, 2005.
Livro póstumo, livro eterno.

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

DESEJO AOS MEUS LEITORES UM SANTO NATAL

Adoração dos Pastores, 1669
JOSEFA DE ÓBIDOS (1630 — 1684)
Óleo sobre Tela, 150 x 184 cm
Museu Nacional de Arte Antiga, Lisboa

LISBOA SEMPRE



Para além de tudo o que aqui atrás ficou escrito sobre a fita, acrescento: em Lisboa, Crónica Anedótica (Portugal, 1930), Leitão de Barros filma os ciclos da vida — da infância à velhice — de uma forma espiritual e bela. As caras e os corpos são retratados com profundidade e sensualidade. É um esteta voyeur que vampiriza as pulsões eróticas das mulheres e homens de Lisboa — nessa inebriante viragem de décadas —, sem, contudo, lhes retirar a energia, ou — muito menos — a alma. Afinal, este autor é também um humanista, com toda o peso histórico e estético que a palavra contém. Assim, atravessando bairros e estractos sociais, mostra várias personagens anónimas da Capital, com notáveis grandes planos de rostos, em toda as suas expressivas personalidades. Por outro lado, quando se trata de planos gerais, como na espantosa sequência das Forças Armadas, com Armada e Exército, os movimentos dos grupos adquirem um valor balético e coreográfico inexcedível até hoje no Cinema Português. Nestas cenas, o efeito de ralenti vem sublinhar a beleza plástica e rítmica das acções: os marinheiros do Navio-Escola Sagres são elevados, nas suas simples tarefas diárias — depois de captados pela sua câmara voyeurista e verista, e após a dinâmica montagem —, à categoria de heróis clássicos, na dimensão escultórica dos corpos atléticos e na coreografia dos marciais movimentos colectivos. Aqui cheira a Couraçado, de Eisenstein, como aliás ao longo de toda a película também se sente Vertov; mas, cá para mim (meu Deus, o que eu vou dizer...), vai-se mais longe em poesia do olhar, pois também pressentimos a influência das vanguardas cinematográficas francesas e alemãs. Leitão de Barros usa Lisboa e os lisboetas como matéria-prima para edificar um filme de arte, simultaneamente lírico e épico, original sinfonia de uma capital, com as fortes marcas identitárias da cidade à vista — onde, ainda hoje, todos nos reconhecemos. Destacaria, a finalizar estas notas de visionamento, escritas e reescritas ao correr das teclas, e só estas, porque este filme não se encerra — pois fugiria certamente! —, uma última sequência: o treino de uma belíssima carga (homens de espada em riste e cavalos galopando, em plena harmonia) levada a cabo pelo Regimento de Cavalaria 7 (onde o meu Pai foi oficial miliciano, diga-se de passagem) ; nestas imagens, em slow motion, é toda uma Ética de Cavalaria — para sempre perdida — que desfila à nossa frente. E, assim, através dessa simbólica manobra militar, vemos, claramente, o fim de toda uma Época. De arrepiar.

CIDADE BRANCA


Em 1 de Abril de 1930, estreia simultaneamente no São Luiz e no Tivoli (parece mentira, mas é verdade; bons tempos!), Lisboa, Crónica Anedótica, de Leitão de Barros. Este cineasta tem como marca principal um apurado sentido estético, partilhado com a extraordinária geração de que faz parte — Chianca de Garcia, Jorge Brum do Canto, António Lopes Ribeiro, Cottinelli Telmo, e outros de igual qualidade.
José Júlio Marques Leitão de Barros nasceu no Porto, filho de um Capitão-de-Mar-e-Guerra, mas foi registado em Lisboa, onde veio a morrer em 1967. Depois de tirar o Curso da Escola de Belas-Artes, foi Professor dos Liceus — o seu manual Elementos de História da Arte é ainda hoje uma referência —, e destacou-se como pintor, estando representado em vários Museus portugueses e estrangeiros. Por outro lado, como dramaturgo, escreveu várias peças que foram representadas no Teatro Nacional e noutras salas. Foi também jornalista em O Século, A Capital e ABC, e fundou e dirigiu Domingo Ilustrado, Notícias Ilustrado e Século Ilustrado; ficaram ainda célebres as suas crónicas semanais no Diário de Notícias, sob o título «Os Corvos» (publicadas em dois volumes, com ilustrações de João Abel Manta). Organizou os cortejos históricos das Festas da Cidade de Lisboa (1934-1935) e foi Secretário-Geral da Exposição do Mundo Português (1940). Tudo isto, e muitas outras actividades de idêntica relevância.
Recuando agora ao seu debute cinematográfico, há que referir 1918 como o ano dos seus primeiros (quatro!) filmes, de que se destaca o infelizmente desaparecido Sidónio Pais — Proclamação do Presidente da República. No entanto, é preciso esperar por 1930, para assistirmos ao seu arranque em duas frentes, ainda no Cinema Mudo, com duas obras de enorme beleza plástica: a já referida Lisboa e Maria do Mar — filme este que marca presença, com exibições habituais, nas principais cinematecas europeias e que a nossa Cinemateca Portuguesa em boa hora restaurou e exibiu, no ano passado, numa sessão onde se perfilaram dez pessoas (sim, eu estava lá com um par de alunos e vi com os meus próprios olhos!). Esta película tinha sido antecedida por Nazaré, Praia de Pescadores (1929), que cativou, de imediato, público e crítica — uma característica deste cineasta ao longo da sua extensa carreira, que coincidiu com uma época de profunda identificação dos portugueses com o seu Cinema.
O viveiro de todo este Novo Cinema, em pleno Estado Novo, seria a Brasileira do Chiado, os escritórios do São Luiz e do Trindade, e os estúdios da Tobis no Lumiar, de cuja fundação Leitão de Barros viria a ser um dos principais impulsionadores.
No início de 1929, Leitão de Barros e António Lopes Ribeiro partem em viagem, à descoberta dos principais estúdios de Cinema da Europa, onde conhecem e convivem com os maiores cineastas desse tempo — da Alemanha à Rússia…! Regressados à Pátria, Leitão de Barros lança-se na rodagem de Lisboa, Crónica Anedótica, a fita que hoje aqui trazemos, e que é um marco mundial na tendência europeia dos documentários poéticos, de matriz futurista, sobre a vida das grandes cidades, que tinha até aí em Berlim, Sinfonia de uma Capital (1926), de Walter Ruttmann, o seu mais alto expoente.
Lembremos aqui que Leitão de Barros, que trabalhava como professor de Desenho e Matemática (mais uma das suas aparentes contradições, mas expressão máxima da sua versatilidade criativa), era um nacionalista puro, sempre em busca da exaltação estética dos valores tradicionais de Portugal; conseguia extrair beleza da nossa Terra e do nosso Povo, numa linguagem moderna e apelativa. O seu apurado sentido de humor fazia-o evitar o ridículo e o mau-gosto (tão comuns na nossa burgessa e deslumbrada burguesia de hoje).
Homem de várias Vidas — pintor, professor, cineasta, jornalista, criador de grandes espectáculos —, foi no Cinema, porém, que encontrou o meio para explanar totalmente a sua Arte: estão aí A Severa (1930) — primeiro filme sonoro português —, As Pupilas do Senhor Reitor (1935), Bocage (1936), Ala-Arriba! (1942) — premiado no Festival de Veneza —, Inez de Castro (1944), Camões (1946), Vendaval Maravilhoso (1949), para o demonstrar, além de vários documentários, que são peças fundamentais para estudar a época histórica do Estado Novo.
Vamos então a Lisboa, Crónica Anedótica, que se faz tarde. Este filme é o mais autêntico documentário feito até hoje sobre a Capital; mas é também, ainda, muito mais do que isso: é uma fita onde aparecem os maiores actores da época — e de sempre?… — do Teatro e do Cinema de Portugal (Nascimento Fernandes, Beatriz Costa, Vasco Santana, Erico Braga, Chaby Pinheiro, Estevão Amarante, Josefina Silva, Eugénio Salvador, Adelina Abranches, Costinha, Alves da Cunha, e muitos outros… — caramba!). Todos eles interpretam personagens típicas de Lisboa, misturadas com as figurais reais do quotidiano da cidade.
Esta convincente articulação de realidade e ficção, de linguagem documental e fantasia, fazem desta obra um caso sério de inovação, qual precursora de fenómenos cinematográficos do pós-II Guerra Mundial, como o neo-realismo italiano. No caso da nossa Lisboa, o verismo antropológico conjuga-se com um requinte formal de artista sofisticado — Leitão de Barros era um esteta — e surge livre de visões marxistas, habitualmente transformadoras dos tipos sociais em estereótipos.
O filme avança em animado ritmo, com uma montagem que assegura a colagem dinâmica dos fragmentos — pitorescos, mas ao mesmo tempo poéticos — e cria um sentido para as imagens (magníficas, do grande operador Artur Costa de Macedo), ao som da Música de Frederico de Freitas, Juan Fabre e António Melo — interpretada ao vivo, pelas melhores orquestras, durante as projecções (Cinema Mudo oblige).
O que seria apenas um documentário, eleva-se, assim, à categoria de grande peça «cinegráfica» (na feliz expressão do meu Saudoso Mestre Luís de Pina, na sua História do Cinema Português).
Ao vermos este filme, sentimos a nostalgia de uma cidade branca, monumental, simples, luminosa, alegre, dinâmica, viva, habitada — com seus tipos genuínos —, com Alma! E, apetece-nos perguntar: — Por que será que agora Lisboa aparece sempre cinzenta e triste no Cinema Português a que temos direito e que pagamos com os nossos impostos?…
Lisboa, Crónica Anedótica apresenta-se, assim, como mais uma prova de que é possível alinhar Portugal com o «ar dos tempos» — a par de Ruttmann e Vertov, neste caso — sem abdicar da Identidade Nacional.
Veja-se e faça-se, de novo!

Nota: Sobre esta fotografia, da rodagem de Lisboa, Crónica Anedótica, que ilustra o meu texto, aconselho a leitura do seguinte post. Com um beijo de bem-haja à confrade bloguista Vera Futscher.

PIONEIRO PORTUGUÊS


Manuel Maria da Costa Veiga inicia a sua actividade cinematográfica como exibidor de filmes estrangeiros em Lisboa. Embora residente em Algés, era uma típica figura da Capital na viragem do século XIX para o XX — dandy alto e espadaúdo, de farta mas cuidada barba à moda. Além do mais, era um curioso e especialista em mecânica e electricidade, o que lhe conferia uma aura de mágico, nesses tempos da iluminação a gaz.
Costa Veiga ajudou Edwin Rousby na primeira exibição em Portugal de imagens em movimento, que decorreu no Real Coliseu da Rua da Palma (hoje desaparecido, para dar lugar a caixotes pós-modernos); sessão essa que teve na assistência o Infante D. Afonso, irmão do Rei D. Carlos I, o que revela o empenho da Casa Real nas novidades científicas e artísticas que estavam a surgir, na Europa, na sequência da primeira apresentação pública — em Paris, a 28 de Dezembro de 1895 — de imagens captadas, reveladas e projectadas pelos irmãos Lumière, com a sua maravilhosa máquina Cinématographe.
A referida estreia lisboeta aconteceu em Junho de 1896 e nela foram projectadas fitas rodadas à volta do Mundo por operadores do pioneiro londrino Robert-William Paul. Foi um sucesso público, esta iniciativa do misterioso exibidor itinerante (húngaro ou americano, ninguém sabe) Edwin Rousby, «o electricista de Budapeste». Este, em Setembro, propicia nova sessão pública em Lisboa, agora com películas já filmadas no nosso País, pelo operador Harry Short, que Paul mandara para o sul da Europa à caça de imagens. A Cinemateca Portuguesa possui dois destes filmes: A Boca do Inferno e A Praia de Algés na Ocasião dos Banhos. Em Janeiro de 1897, Rousby parte definitivamente de Portugal, mas deixa em Lisboa a semente da cinefilia.
Depois deste flashback, para enquadramento histórico da aparição do Cinema («Animatógrafo», nas palavras de então) em Lisboa, vamos ao nosso pioneiro: Costa Veiga, após várias tentativas falhadas nesse sentido, conseguiu estabelecer-se como exibidor, inaugurando o Éden Concerto, aos Restauradores, e a Esplanada D. Luiz Filipe, em Cascais. Não tardou, no entanto, a dar o salto para a produção de filmes. Assim, aproveitando a estada sazonal do Rei D. Carlos em Cascais, no Verão de 1899, filma a Pessoa Real na praia, capta mais algumas vistas da então famosa estância balnear, e, finalmente, apresenta a sua primeira película: Aspectos da Praia de Cascais.
Foi o início de uma carreira de grande actividade como documentarista (palavra e conceito inexistentes à época, mas é disso que se trata), que atravessará toda a primeira década do século XX, registando os principais acontecimentos sociais e políticos, com a sua câmara inglesa Urban.
As vindas a Portugal de Chefes de Estado, e outras altas figuras, não lhe escaparam; e, temos, assim, a Série — interessante e fundamental para a compreensão da História da Europa — «Visitas a Lisboa»: Eduardo VII (1903), Afonso XIII (1903), Duques de Connaught (1903) Imperador da Alemanha Guilherme II (1905), Presidente de França Émile Loubet (1905), Rei de Saxe (1908).
Por este motivo, ficou conhecido por «Cineasta dos Reis», em oposição jocosa ao seu contemporâneo Aurélio da Paz dos Reis, «o Reis Cineasta», do Porto — primeiro português a dar à manivela uma câmara de filmar; e, revolucionário republicano, por sinal… Deste, falaremos noutro dia.
Entretanto, Costa Veiga fundou uma empresa produtora de Cinema — Portugal Filme —, continuando ainda a sua actividade profissional nos ramos da exibição e distribuição de fitas. Descobriu também, para o Cinema Português, Artur Costa de Macedo, que viria a ser um dos nossos melhores directores de fotografia, decisivo na Época de Ouro do Cinema Português (décadas de 1930 e 1940), e que trabalhava antes na garagem Auto-Palace, ao Rato.
Num tempo muito anterior ao advento da Televisão, era através do Cinema que os Estados comunicavam com os seus cidadãos e passavam para o exterior as imagens do País. Neste contexto, os filmes de Costa Veiga fizeram parte de uma grande e última ofensiva diplomática da Monarquia Portuguesa. A já referida Série «Visitas a Lisboa» foi distribuída por toda a Europa, com o apoio do Rei D. Carlos, mostrando Lisboa, como capital cosmopolita, acolhendo as principais figuras políticas do Mundo.
Note-se que os filmes, embora numa fase embrionária da Sétima Arte — em formato de curtas-metragens, a preto-e-branco, mudos —, eram um negócio rentável; e, Costa Veiga pôde enriquecer com a produção, distribuição e exibição de fitas, despertando, desta maneira, o apetite de muitos outros para esta indústria, os quais não tardaram a aparecer, em força, em Lisboa.
Sendo Costa Veiga «O Cineasta dos Reis», de facto, pode também dizer-se que a sua carreira sofre um grande abalo com o horrível Regicídio de 1 de Fevereiro de 1908 no Terreiro do Paço. Temos assim — simbolicamente — como uma das últimas obras do realizador: Os Funerais de S. M. El-Rei D. Carlos I e do Príncipe Real D. Luiz Filipe (1908).
Agora, depois de já passados cem anos sobre o cobarde crime do Terreiro do Paço, não será a hora de se desenterrarem e exibirem os filmes do pioneiro lisboeta — do Cinema Nacional — Manuel Maria da Costa Veiga?

FADO FILMADO


Em Portugal, no ano de 1947, entre as sete longas-metragens produzidas, surge Fado, História d’Uma Cantadeira, que, dez anos depois, virá a ser o primeiro filme exibido pela Televisão Portuguesa, no arranque da RTP.
O seu realizador é Perdigão Queiroga, nascido em Évora, em 1916, e morto fisicamente num acidente de automóvel, em 1980. Este cineasta, depois de uma fase de aprendizagem das técnicas cinematográficas, trabalha como profissional nas áreas da imagem e da montagem. De seguida, em plena II Guerra Mundial, e Golden Age do Cinema Americano, ruma a Hollywood — para os estúdios da major Paramount (uma das cinco maiores empresas de produção cinematográfica dos E. U. A.) —, onde trabalha em montagem. De regresso à Pátria, inicia a preparação de Fado, que será o seu primeiro filme de fundo, numa obra com dezenas de títulos.
A sua filmografia divide-se, como era hábito nos autores clássicos completos, entre documentários (a que hoje chamaríamos «institucionais») e longas-metragens de ficção. Outro ponto alto da sua carreira viria a ser As Pupilas do Senhor Reitor (1961), a partir de Júlio Diniz, e que foi o primeiro filme nacional rodado em cinemascope (formato de ecrã largo).
Mas vamos ao nosso Fado, História d’Uma Cantadeira (1947), de Perdigão Queiroga, que a isso viemos e nisso estamos. Este filme baseia-se, muito livremente, na biografia da grande Amália Rodrigues, então no auge da sua carreira e beleza. Será esta formidável «cantadeira» a protagonizar a fita, com a qual iluminará a tela, como estrela deste melodrama romântico. Para que a musa lusa brilhe, em toda a sua plenitude, muito ajudarão os belíssimos fados de Frederico de Freitas, as letras de Amadeu do Vale, Linhares Barbosa, Gabriel de Oliveira e João Mota, as «sínteses de fados» de Frederico Valério e Jaime Santos, os versos de Silva Tavares e José Galhardo; e, toda esta equipa de luxo, sob a direcção musical de Jaime Mendes.
Abordemos então agora a história, propriamente dita: os cânones do melodrama, herdados — pelo Cinema — da Literatura e do Teatro do século XIX, estão lá todos; e, de uma forma não muito diferente daquela como eram praticados, à época, em Hollywood, mas convenientemente transpostos para a realidade social da Lisboa dos anos 40 do século passado, como se pretende.
Assim, temos uma fadista pobre de Alfama, com um namorado (o guitarrista Júlio — interpretado convincentemente pelo grande Virgílio Teixeira), que, tornando-se famosa, sai do seu bairro, abandonando o apaixonado companheiro e trocando-o pelos círculos da alta-burguesia e da aristocracia de Lisboa. Por fim, depois de peripécias várias, numa trama narrativa bem urdida, temos um final na boa tradição do happy end da Capital do Cinema. Se destaco esta ligação ao cinema clássico narrativo sonoro, que tinha as suas regras ditadas pelos norte-americanos, é porque o filme tem uma desenvoltura própria dos melhores produtos saídos dessas «fábricas de sonhos» que eram os Estúdios de Hollywood.
Perdigão Queiroga junta-lhe ainda os principais ingredientes da Cultura Popular Portuguesa — olhada por alguns arrivistas com desconfiança, pois talvez lhes faça lembrar o berço que renegam —, e, assim, conseguiu fazer um filme que é um dos maiores êxitos de bilheteira — até hoje — do Cinema Português, ao mesmo tempo que recebeu críticas muitíssimo positivas; conjugação esta não habitual. Capas Negras, de Armando de Miranda, desse mesmo ano e também com Amália, foi demolido pela crítica, e com toda a razão, devido ao cinema pobrezinho que revelava.
Neste caso — no nosso Fado —, o pano de fundo de carácter realista com que são pintados os bairros tradicionais de Lisboa, a excepcional representação do galã português de dimensão internacional — Virgílio Teixeira —, o rosto, a voz, e a naturalidade expressiva de Amália, o rigor fotográfico de Francesco Izzarelli, a fluidez da montagem do próprio Perdigão Queiroga — em «estilo invisível», à maneira de Hollywood —, as presenças de António Silva, Vasco Santana, Eugénio Salvador, Tony d’Algy, Raul de Carvalho, e mais uma mão cheia de outros grandes actores, fizeram toda a diferença.
Convém aqui realçar que o Fado e os Toiros são dois mitos permanentes da iconografia nacional; e, se convenientemente levados para a Cinematografia Portuguesa — com um tratamento narrativo e plástico sempre renovado, de acordo com o espírito dos tempos —, podem constituir-se como uma das matrizes estruturais de um verdadeiro género indígena. Os E. U. A. fazem exactamente o mesmo com os seus géneros: Western, Gangsters, Musical. Esta linha do Cinema Português foi, aliás, logo consagrada no primeiro filme sonoro (sonorizado, no entanto, ainda, em França): Severa, de Leitão de Barros.
Em relação a Fado, História d’Uma Cantadeira, diga-se que o Estado Novo — através do SNI, de António Ferro — pareceu gostar a atribuiu-lhe o Grande Prémio, nesse ano de 1947, demarcando-se, deste modo, de Capas Negras, que, apesar de tudo, teve um maior sucesso de bilheteira na época (e mesmo, também, um dos maiores de sempre, até à actualidade).
De facto, António Ferro, com o seu inovador bom-gosto, sabia o que fazia ao distinguir este filme, pois Fado tem tudo: por um lado, uma extraordinária beleza plástica — esse rosto de Amália nada fica a dever aos de outras divas do Cinema Mundial, muito graças ao já referido director de fotografia italiano, que tinha trabalhado no Camões, de Leitão de Barros, e que tem um estilo visual a fazer lembrar o expressionismo alemão; por outro, a banda sonora, já convenientemente aqui destacada, que reunia os melhores autores da música popular portuguesa de então. Finalmente, os diálogos — esse ponto fraco da Cinematografia Nacional — são convincentes e vivos, e ditos com boa dicção, e ainda melhor interpretação, depois de saídos da pena criativa de Armando Vieira Pinto.
E agora vou mas é rever a fita, que fiquei cheio de vontade, e esperar — pessimista, mas esperançoso que sou — que o Cinema Português se reconcilie com o seu público e possa voltar a erguer produções desta dimensão, para que, como neste caso, não abdicando da requintada expressão estética do autor, possa servir, com narrativas escorreitas e simples, temas onde as pessoas realmente se revejam, pois já basta de décadas de divagações umbiguistas, em tom hermético, para consumo próprio (com honrosas excepções, apesar de tudo).
Bem sei que já não temos Amália, aqui e ao vivo, nem Virgílio Teixeira — e que falta fazem! —, mas há por cá novos e bons actores — potenciais novas estrelas! Estarão os actores portugueses para sempre fadados a fazer telenovelas em manhoso estilo sul-americano, ou poderão voltar a brilhar em Filmes Portugueses populares e de qualidade?...
A ver vamos.

CINCO ANOS DE VIDA NA BLOGOSFERA

Estou no Blogger desde 19 de Dezembro de 2006. Fez ontem cinco anos. Entrei e estreei-me logo no blogue colectivo do meu antigo Liceu. Um mês e dois dias depois aventurei-me a solo com o Eternas Saudades do Futuro.

AMOR À ARTE


António Lopes Ribeiro (Lisboa, 1908 — Lisboa, 1995) é cineasta, jornalista e crítico de Cinema. Entenda-se aqui a palavra cineasta na sua acepção total: Lopes Ribeiro foi realizador, argumentista, produtor, director artístico e montador. Temos, assim, um homem que respira Cinema.
Estudou engenharia no Instituto Superior Técnico, mas logo o abandonou, em 1929, para se entregar à Sétima Arte a tempo inteiro.
Nos anos 20, dedica-se ao jornalismo; e, estreia-se na crítica cinematográfica no Diário de Lisboa com uma página própria, «Arte Cinematográfica — O Claro-Escuro Animado», onde usa as iniciais A. R. e o pseudónimo Retardador, a partir de 1927; esta rubrica terá sido a primeira — em todo o Mundo — dedicada exclusivamente ao Cinema num jornal diário. De seguida, funda e dirige as revistas especializadas Imagem (1928), Kino (1930) e Animatógrafo (1933). Colabora ainda, ao longo de toda a sua longa vida, nas seguintes publicações, entre outras: A Bola, Diário Popular, Cine-Jornal, A Revista de Portugal e A Rua.
Inicia-se como realizador, em 1928 — aos 20 anos de idade —, com o documentário artístico Bailando ao Sol. Lança-se, a partir daí, numa carreira que terá mais de 100 títulos e que só será interrompida — à força! — em 1974. Nessa vasta Obra, encontramos documentários, adaptações literárias, dramas, e comédias. O arranque da sua actividade cinematográfica encontra-se fortemente enraizado nos conhecimentos técnicos que adquiriu em visitas aos estúdios alemães e russos (um bom exemplo do amor à arte e à estética quebrando fronteiras políticas e ideológicas).
Foi, enquanto teórico, um apologista do Cinema Sonoro, contrariando muitos dos seus camaradas de ofício da época, que viam no Sonoro um desvirtuar do Cinema como forma de expressão artística, pois passaria a ser — segundo eles — um mero meio de reprodução da realidade. Lopes Ribeiro viu, antes de todos, que o Som — se bem utilizado — poderia ajudar o Cinema a crescer como Arte. Assim foi.
Os seus documentários são, na sua maior parte, encomendas do Estado Novo, através de vários Organismos. Mostrar-se-á, neste domínio, um Autor rigoroso, do ponto-de-vista histórico, e com um fino sentido estético. Destacaria, nesta área, os seguintes documentários: A Exposição do Mundo Português (1941), Inauguração do Estádio Nacional (1944), A Morte e a Vida do Engenheiro Duarte Pacheco (1944), O Cortejo Histórico de Lisboa (1947), Jubileu de Salazar (1953), Rainha Isabel II em Portugal (1957). Se quisermos conhecer a História de Portugal do Século XX, teremos de vê-los a todos — dezenas de títulos, de semelhante nível técnico-artístico e igual valor histórico, repartidos entre curtas-metragens e longas-metragens documentais. Um olissipógrafo que se preze deverá visionar os seus documentários sobre Lisboa, antes de escrever o que quer que seja sobre a antiga Capital do Império.
Quanto ao Cinema de ficção, Lopes Ribeiro saberá integrar muito bem nas suas equipas um conjunto de luxo de técnicos provenientes da Alemanha, e assegurar, desta forma, um sentido visual apurado — na luz, nos enquadramentos, e nos movimentos de câmara — nos seus filmes. A sua primeira longa-metragen de ficção — Gado Bravo (1934) — irá logo deixar bem à vista do público essas marcas. Note-se que a propósito desta fita rodou um documentário («making-of», no vocabulário técnico de hoje; coisa inédita à época).
António Ferro — que sabia, como ninguém, detectar talentos — vai desafiá-lo a rodar uma película sobre a Revolução Nacional de 28 de Maio de 1926, a fim de Comemorar os seus 10 anos. O argumento é escrito por António Lopes Ribeiro e pelo próprio António Ferro (com os pseudónimos de Baltazar Fernandes e Jorge Afonso, respectivamente) e terá a produção assegurada pelo Secretariado de Propaganda Nacional. Sobre esta fita — A Revolução de Maio (1937) —, não resisto a relembrar aqui o sucedido, há uns anos atrás, quando algum «especialista» de programação da RTP decidiu exibir este filme, no 1.º de Maio, julgando tratar-se de uma película panegírica da data...! Ia caindo o Carmo e a Trindade!...
A partir de 1938, na sua nova responsabilidade de director artístico da Missão Cinegráfica às Colónias de África, visita e trabalha — supervisionando e dirigindo produções — nas Províncias Ultramarinas. Resultante desta aproximação a África, surge Feitiço do Império (1940); ainda hoje um filme de grande escala e enredo cativante, e a necessitar de urgente reposição para que as novas gerações digam de sua justiça.
Em 1941, cria as Produções Lopes Ribeiro, com o objectivo de produzir longas-metragens de ficção, ou filmes de fundo, entre os quais temos a nata do Cinematografia Portuguesa do Século XX: O Pátio das Cantigas (1942), de Francisco Ribeiro (seu irmão «Ribeirinho»); Aniki-Bóbó (1942), de Manoel de Oliveira; Camões (1946), de Leitão de Barros; para além de todas as Comédias Portuguesas que iluminaram a Época de Ouro do Cinema Nacional.
Para podermos avaliar convenientemente a genialidade heterodoxa deste Autor, esplanada em géneros cinematográficos tão distintos, basta referir O Pai Tirano (1941), que representa um certo paradigma da Comédia Portuguesa, e Amor de Perdição (1943), exemplo perfeito de como se pode obter êxito comercial com adaptações de qualidade de clássicos da Literatura Portuguesa.
Toda esta Obra Cinematográfica foi construída a par de uma outra carreira como Homem de Teatro. Fundou a Companhia «Os Comediantes de Lisboa», que actuou sucessivamente no Teatro da Trindade, no Teatro Avenida, e no Teatro Apolo; e, em 1952, fundou o «Teatro do Povo», que levou à cena desde Gil Vicente até peças da sua própria autoria.
Numa outra frente, traduziu Tchekov, Maeterlinck, Pagnol, Maugham e Giradoux, entre outros.
Como escritor, publicou O Livro de Aventuras (1939) e O Livro das Histórias (1940) — colectâneas de sonetos e poemas; editou ainda as várias compilações das suas crónicas, destacando-se: Esta Pressa de Agora (1962), Anti-Coisas & Tele-Coisas (1963) e Belas-Artes & Malas-Artes (1964).
Na televisão, ficou na memória de várias gerações de famílias portuguesas com o seu programa semanal Museu do Cinema, fazendo dupla com o famoso pianista «mudo» António Melo, entre 1957 (ano de fundação da RTP) e 1974 (ano do não desejado fim da sua brilhante carreira).
Homens destes já não se fazem hoje. Saibamos merecê-los; e, para isso, comecemos por conhecê-los.

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

EXPRESSO DO OCIDENTE

Quarta-feira, 14 de Dezembro
Já é público: o Tribunal da Relação deu, por unanimidade, provimento a um dos cinquenta e quatro mil recursos apresentados pela defesa de Isaltino Morais, ao que parece sobre a prescrição de crimes de fraude fiscal pelos quais terá sido condenado a pena de prisão efectiva. Ora, uma vez que Isaltino Morais não é o Zé dos Anzóis que, na mesma situação, há muito estaria já na pildra, o caso regressa agora a Oeiras ganhando-se mais algum tempo precioso para os propósitos do tio do taxista na Suíça. Mantenho que, em estando no lugar da juíza da comarca, eu punha-me a pau não fosse dar-se o caso de ainda ser a meretíssima a ficar a ver o sol aos quadradinhos ou, se não tanto, pelo menos a ver a carreira arruinada como aquele outro juiz que, vai para uns anos, colocou uns quantos pedófilos em prisão preventiva e que, juram as gazetas de tempos a tempos, está como aqueles árbitros que povoam a Jarra quando não redigem o relatório que o sistema futebolístico espera deles.

Quinta-feira, 15 de Dezembro
Pedro Nuno Soares, uma criatura que ninguém sabe quem seja mas que apesar disso é vice-presidente do grupo parlamentar do PS e líder do agrupamento no distrito de Aveiro, conheceu hoje os seus cinco minutos de fama e não necessariamente pelas melhores razões. Tudo espremido, diz o cavalheiro em nacos que oscilam entre a alucinação e a demagogia mais bacoca, que Portugal deveria suspender o pagamento da dívida na medida em que isso iria deixar os banqueiros alemães "com as pernas a tremer"! Amplamente dotado, como facilmente se constata, de largos conhecimentos de Finanças, Relações Internacionais, Estratégia e o mais que as Ciências Humanas registem nas estantes do conhecimento, aposto tudo aquilo que quiserem em como o senhor deputado, na linha da melhor escola socialista, vai chegar a ministro mais cedo do que tarde. Podem escrever, a este fixem-lhe o nome.

Sexta-feira, 16 de Dezembro
O ex-presidente francês Jacques Chirac foi ontem condenado por desvio de fundos públicos e só não foi ver o sol efectivamente aos quadradinhos na medida em que o tribunal terá mostrado alguma piedade pelo estado de saúde em que alegadamente o meliante se encontra. Convém registar - na medida em que estas coisas ajudam também a explicar o estado a que a Europa chegou - que esta criatura foi eleita na segunda volta das presidenciais francesas de 2002 por uma multidão em estado de histeria colectiva, na qual podemos aliás incluir toda a opinião publicada em Portugal - sendo todos eles responsáveis, portanto. Como ontem anotou e bem Jean-Marie Le Pen, "fui derrotado por um homem que deveria na altura estar na prisão. A França teve um delinquente na presidência durante 12 anos". Nem mais.

Sábado, 17 de Dezembro
Informa a edição de hoje do i que os indicadores de actividade económica e do consumo privado do Banco de Portugal atingiram em Novembro mínimos históricos de 1978. Aos mal intencionados que pudessem duvidar, fica cabalmente demonstrado o êxito tremendo de trinta e cinco anos de partidocracia e de baixa política. A andar para a frente a este ritmo, mais uns mesitos e rebenta por aí o PREC...

Domingo, 18 de Dezembro
Depois de ontem ter garantido que daqui por duas décadas as reformas serão no máximo metade daquilo que representam hoje - o português prudente traduz para português corrente e entende estas palavras como um "arranja forma de juntar algum porque quando lá chegares não vais ver um tostão apesar de teres descontado toda a vida para os rendimentos mínimos de quem ganha por fora uma pipa de massa e para as reformas douradas dos deputados que deputam oito anos" -, Passos Coelho (assumindo-se cada vez mais como mero presidente de uma comissão liquidatária) aconselha agora os professores a seguirem o percurso de Linda de Suza e, de valise de carton em mãos ambas, emigrarem em busca de uns trocados. Regista-se então que o primeiro-ministro aplica aos professores o que, há mês e picos, um qualquer secretário de Estado desses a quem nem fixamos a graça aconselhava a todos os desempregados portugueses: pirem-se daqui enquanto é tempo! Como falávamos do PREC, isto recorda-me inevitavelmente aquela velha pintura que em 1975 coloria um dos muros do Aeroporto de Lisboa: "o último a sair que apague a luz".

Pedro Guedes da Silva

domingo, 18 de dezembro de 2011

ALEGRIA DE VIVER


Em Dezembro de 1932, iniciaram-se os trabalhos de edificação do estúdio cinematográfico da Tobis, na Quinta das Conchas, ao Lumiar, em Lisboa. No início do ano, tinha sido dado o arranque para a Companhia Portuguesa de Filmes Sonoros Tobis Klang Film, que se constituiu formalmente em Junho de 1932. Este nome ficou a dever-se à casa-mãe alemã (Tobis, abreviatura de Tonbild SyndiKat), por ter sido esta a fornecer-lhe a aparelhagem técnica. Lisboa e Berlim surgem assim de mãos dadas, para o advento do Cinema Sonoro em Portugal.
O então jovem arquitecto Cottinelli Telmo desenha e orienta a construção do estúdio, num radical projecto de fino recorte moderno e funcional, em articulação com a bela paisagem envolvente. José Ângelo Cottinelli Telmo nasceu em Lisboa, em Novembro de 1897, e viria a morrer num trágico acidente de pesca desportiva na Praia do Guincho, sportsman que era, em 1948. Filho de músicos, entra em 1915 para as Belas-Artes de Lisboa, a fim de cursar Arquitectura. Antes de aí se licenciar, em 1920, Cottinelli participa nas animadas tertúlias do Chiado, onde convive com os «novos», virando as costas ao academismo passadista da escola. Dessas relações sairiam, por exemplo, trabalhos para bailados (com Almada Negreiros), bandas desenhadas (para o ABC), décors de filmes de Leitão de Barros, e etc. e tal. Revelou-se, ainda, como actor e compositor, nas festas de estudantes de Belas-Artes. Como arquitecto, constrói alguns dos primeiros edifícios modernistas de Lisboa: Stand da FIAT (Av.da Liberdade, 1926-1929); Estação Fluvial do Terreiro do Paço (1928-1932); e, finalmente, a nossa Tobis. Carreira esta que atingiria o apogeu com a sua nomeação para arquitecto-chefe da Exposição do Mundo Português, em 1940.
Foi, por esta altura, o principal colaborador de Duarte Pacheco (se este não tivesse morrido em 1943, Cottinelli em 1948, e Ferro em 1956, a História das Artes e dos Espectáculos, no Século XX, em Portugal, teria cantado mais alto… mas, essa é outra história… fica para a próxima).
A Tobis só ficou concluída no ano de 1934. No entanto, antes disso, Portugal vai ter o seu primeiro filme sonoro rodado aí, num plateau improvisado. Ao mesmo tempo que orienta a construção do estúdio, que, no local, era dirigida pelo francês A. P. Richard, Telmo escrevia e realizava A Canção de Lisboa, tendo como conselheiro técnico Chianca de Garcia, outro dos grandes entusiastas da Tobis, desde a primeira hora, a par de Cottinelli Telmo e Leitão de Barros.
A Canção de Lisboa surge, pois, como fruto da gente nova, formada na cinefilia, no culto das Artes, e no bom-gosto. Se esta nova geração está pronta, e as infra-estruturas lançadas no terreno, faltavam ainda técnicos e actores para dar corpo ao primeiro filme sonoro totalmente feito (rodado e sonorizado) em Portugal.
Olhando com atenção para a ficha técnica (hábito perdido nos apressados dias de hoje, onde nos servem ao domicílio os filmes amputados dessa parte), descobrimos toda a fina-flor da Arte Portuguesa de então. O próprio genérico é de Almada Negreiros, que desenha também os dois cartazes do filme; o pintor Carlos Botelho é assistente de realização; José Galhardo escreve os inesquecíveis diálogos e as letras das canções, que passam de pais para filhos há mais de setenta anos; encontramos um trio de luxo na fotografia — Henri Barreyre, Octávio Bobone e César de Sá; o «russo branco» — vindo do Cinema Mudo Russo (pré-soviético; pois não foram os comunistas que lá inventaram o Cinema, como alguns parecem pensar) — Chakatonny; o engenheiro Paulo de Brito Aranha na direcção de som (cargo que iria manter na Tobis, por largos anos); o poeta José Gomes Ferreira — esse mesmo! — na assistência de montagem; Raul Ferrão e Raul Portela na autoria da música das canções; e, por aí fora…
Os actores constituem um elenco «de se lhe tirar o chapéu»: Vasco Santana, Beatriz Costa, António Silva, Teresa Gomes, Álvaro de Almeida, Manuel Santos Carvalho, e o jovem realizador Manoel de Oliveira, numa breve aparição como o galã, bon-vivant (que, de facto, era) e fiel amigo, Carlos, do desgraçado Vasquinho (Vasco Santana).
A articulação entre as equipas técnica e artística contou com a preciosa colaboração de técnicos profissionais vindos, essencialmente, da Alemanha e de França: Hans-Christof Wolhrab, Tonka Taldy, Jeanette Pakon, para além dos já nomeados anteriormente.
Sinal dos tempos, é de referir que Beatriz Costa saía de uma peça de teatro de revista, em cena na altura, onde era cabeça de cartaz, às duas horas da manhã, e apresentava-se às sete horas, da mesma manhã, na Tobis, impecavelmente maquilhada, à espera da ordem: «Acção!».
Por tudo isto, estamos perante um filme fundador: não só do Cinema Sonoro Português, mas do género fílmico da Comédia Portuguesa. Até hoje, tudo o que se tenta fazer, neste domínio, continua a ter como referência e influência A Canção de Lisboa.
Não vamos contar aqui a história da fita, pois ela está gravada na memória colectiva das famílias da nossa Terra. Parece-me é ser importante, para os intelectuais desconfiados do género cómico, lembrar que, à época, também René Clair e Jean Renoir o praticavam, na Europa; e, vendo a nossa Canção ao lado dessas películas, percebemos que o Cinema Português esteve alinhado com o «espírito do tempo» e conseguiu — simultaneamente — ser espelho da comunidade lisboeta, em todos os seus detalhes de puzzle social complexo, por de trás de uma aparente simplicidade brejeira.
Não basta, de facto, olhar. É preciso ver. E, para isso, há que lavar os olhos entre dois olhares, libertando-os de preconceitos aviados em estilo erudito por certos escribas da nossa praça que conseguem descortinar maravilhas nos mais obscuros objectos (antes fosse o do Buñuel) e cegar perante a luminosidade d’A Canção de Lisboa.
Aproveitemos esta Quadra de Vida para a revermos — em Família.
Alguns cépticos perguntarão ainda: «Mas o que é que a fita tem?». Tem uma história bem contada — o estudante de Medicina, apaixonado pela costureirinha do bairro, filha de um «pai tirano», surpreendido pelas velhas tias tontas, mas ricas, e provincianas —, diálogos de extraordinário ritmo — ditos com irrepreensível dicção, e cheios de segundos sentidos e trocadilhos —, actores que representam com alegria e vivacidade, uma bela estrutura musical, o fado, o lirismo, os sentimentos — sem ser sentimentalista —, as piadas, a psicologia do Povo Português (Lisboa como síntese da Alma Nacional) apresentada com naturalidade e com subtil — quase invisível — profundidade.
Tão simples… e tão difícil de fazer de novo!

sábado, 17 de dezembro de 2011

TERRA E POVO


Em 1953, ano em que apenas se produzem e estreiam cinco filmes em Portugal, anunciando assim uma tendência de empobrecimento, após os Anos de Ouro das décadas de 1930 e 1940, surge — como lufada de ar fresco e tiro no escuro — o melhor filme de sempre, da nossa cinematografia, sobre o Ultramar.
Chaimite, de Jorge Brum do Canto — autor maior da História do Cinema Português, completamente apagado nos dias de hoje pela historiografia oficial —, é a segunda longa-metragem nacional sobre a matéria. Facto estranho este, que confirma o inexplicável desinteresse dos nossos produtores pelo tema (que tem pano para mangas, aliás). É o primeiro filme da empresa de produção Cinal, dirigida pelo Professor Luís Pinto Coelho, que se caracteriza por películas de qualidade.
Jorge Brum do Canto atingiu, nesta obra, uma autenticidade nas reconstituições de época e militares, como nunca mais o nosso Cinema logrou alcançar. Se, no que diz respeito à imagem, ao som e à montagem, percebemos que estamos na presença de um esteta — Brum do Canto iniciou-se com a Geração de 1930, profundamente ligada à modernidade cultural portuguesa, onde também se perfilaram, como cinéfilos ou cineastas, Leitão de Barros, Cottinelli Telmo, António Lopes Ribeiro, Chianca de Garcia, Dr. Ricardo Jorge (médico, cinéfilo, escritor), João Ortigão Ramos, Dr. Félix Ribeiro (médico, cinéfilo, fundador e primeiro director da Cinemateca Portuguesa), Domingos Mascarenhas, e muitos outros, de igual calibre, que se constituíram como tertúlia cinematográfica no Cine-Teatro S. Luís (aberto em 1928) —, por outro lado, no que se refere à História, é um cineasta profundamente conhecedor do assunto abordado que avança para este arriscado registo épico de Chaimite.
O filme — na linha de Feitiço do Império (1940), de António Lopes Ribeiro — mostra o heróico esforço português para defender o Ultramar dos ataques estrangeiros — neste caso inglês, sendo assim premonitório das cobiças americana e soviética —, e não é, como muitas vezes erradamente se refere, uma fita contra a revolta vátua, nem, muito menos, contra a sua identidade enquanto povo. Digamos que é um filme pela positiva: eleva Portugal, respeitando os que se lhe opunham directamente; mas denuncia os ingleses, que pretendem levar os moçambicanos à revolta contra Portugal para alimentar os seus apetites imperiais.
Mouzinho de Albuquerque (interpretado por Jacinto Ramos) destaca-se como grande protagonista, herói e fio-condutor da narrativa, não apagando, note-se, os outros camaradas de armas — Caldas Xavier (Augusto Figueiredo) e Paiva Couceiro (o próprio Brum do Canto, num notável trabalho de actor).
É que este cineasta era o protótipo do artista-total: neste filme assina o argumento, os diálogos, a planificação, a realização, a montagem, e actua. Sabia-se ainda fazer rodear dos melhores: a demonstrá-lo encontramos na música Joly Braga Santos, e na fotografia — de belíssimos e ousados enquadramentos — César de Sá e Aurélio Rodrigues, para além de termos o Major Vassalo Pandayo como consultor militar.
A biografia de um criador contém, quase sempre, a chave para a sua Obra. Neste caso, a tradição familiar, em que Jorge Brum do Canto bebeu, revela-se fundamental. Nascido e criado numa família católica e monárquica — próxima da Família Real e amiga de Paiva Couceiro —, habituou-se a pensar pela sua própria cabeça — nunca se envolveu institucionalmente com o Estado Novo, embora dele fosse simpatizante — e foi um homem culto e livre. Sabemos que apreciava António Ferro, pelo projecto que este tinha para as Artes Nacionais, e, por sua vez, era admirado por Carmona.
Encontramos como tema principal do seu Cinema, nas suas próprias palavras, «a Terra e o Povo». Portugal e os Portugueses vão ser, assim, os protagonistas de uma filmografia que se esplana, entre 1929 e 1984, por 23 filmes — do vanguardista A Dança dos Paroxismos (1929) ao policial O Crime de Simão Bolandas (1984), passando por documentários e obras de ficção. Quem quiser encontrar a nação em toda a sua diversidade e plenitude, terá de ver A Canção da Terra (1938), Lobos da Serra (1942), Fátima, Terra de Fé (1943), Um Homem às Direitas (1945), e A Cruz de Ferro (1968).
Voltando a Chaimite: a acção desenrola-se, temporalmente, entre 1894, momento do ataque a Lourenço Marques pelos africanos, e 1897, altura em que Mouzinho, Comissário Régio de Moçambique, vence definitivamente os vátuas, derrotando Maguiguana, que tinha escapado durante a captura de Gungunhana. A fita alia este lado épico a um tom intimista, ao mostrar a Mulher de Mouzinho, presença discreta mas firme, verdadeira apoiante e companheira das empresas do herói. Paralelamente, o realizador dá-nos ainda uma história de amor entre um soldado e uma bela rapariga, com um final feliz. Cabe aqui destacar que Chaimite tem também valor como documento histórico para o estudo da vida colonial da época, que é retratada com verosimilhança e mestria, desde a da cidade até à do mato.
Para a «coisa militar», Brum do Canto baseou-se no livro A Guerra de África em 1895, de António Ennes, e em textos do próprio Mouzinho, o que assegura o rigor histórico-militar. Ainda no campo da autenticidade, é de realçar que os indígenas africanos falam nos seus dialectos próprios — muda a tribo, muda a língua —, criando assim um verdadeiro realismo, tão em voga nesses mesmos anos de 1950 noutras paragens. O difícil será, como neste caso, juntar, no mesmo filme, uma escala monumental, num registo de credível reconstituição histórica, a um intimismo de fino recorte humano. E, se termino falando na escala, é porque Chaimite atinge uma grandiosidade no tratamento do espaço e dos cenários, servindo o argumento na sua enorme dimensão épica, como nunca mais o Cinema Português — e, de um modo geral, a Arte Nacional — conseguiu fazer.
Saibam os jovens realizadores pôr os olhos em Chaimite, para se poderem aventurar em novas e belas criações, com som e imagens em movimento, nesta linguagem universal que o Cinema é — e que sai sempre enriquecida quando trata temas que dizem respeito aos Povos, como aqui bem se vê.
Veja-se, pois!

quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

NÃO TENHAMOS MEDO


Depois de no passado dia 27 de Novembro, primeiro Domingo do Advento, termos posto o Estandarte de Natal do Menino Jesus à varanda, contribuindo assim para colorir espiritualmente Portugal, vamos agora colocar no dia 18 de Dezembro, último Domingo do Advento, esta mesma Imagem como «Foto de Perfil» no Facebook, ajudando desta forma a iluminar a Internet.
Não tenhamos vergonha nem medo. Saibamos ser uma minoria serena mas activa!

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

VIAJAR É PRECISO

A globalização, o multiculturalismo e o ridículo turismo de massas (já Tati avisava no seu genial Playtime...) vieram uniformizar as grandes cidades de tal maneira — descaracterizando-as brutalmente — que cheguei ao triste ponto de não ter hoje a mínima vontade de visitar as minhas outrora queridas capitais europeias. As próximas incursões que farei serão certamente ao mundo rural. Aí, ainda se respira identidade. Por enquanto, vou passeando através de livros, pinturas, fotografias, discos e filmes. São as minhas pessoalíssimas viagens interiores.

JUVENTUDE EM MARCHA

Estou para aqui verdadeiramente deliciado a ver os projectos pessoais dos meus alunos. Esperam-me, para avaliar correctamente estes trabalhos, umas belas directas; digo bem, belas, pois estou realmente encantado com o que tenho entre mãos e à frente dos olhos. Enfim, sangue novo ainda surpreende lobo velho. Bravo!, para eles.

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

DA VIDA SOCIAL CONTEMPORÂNEA

Aproxima-se o Natal e o Fim do Ano e há logo umas pessoas que começam a querer combinar imensas e intensas actividades sociais. Durante muito tempo considerei essas almoçaradas e jantaradas anuais supérfluas; pois se estava habitualmente, ou sempre que queria, com esses amigos, por que carga de água haveria a necessidade de marcar-se encontros por obrigação? O que é um facto é que o tempo foi correndo, cada um foi para seu lado e à sua vida, e, não aparecendo agora as tais almas caridosas a quererem reunir os grupos, passar-se-iam anos sem nos vermos. Bem-hajam, portanto.

A INSUSTENTÁVEL LEVEZA DO SER

Confesso que me deleito a ver filmes publicitários de perfumes. Que me perdoem portanto os meus leitores mais intelectuais, mas também tenho direito às minhas superficialidades.

MON COEUR BALANCE...

Downton Abbey ou Aristocrats? A Fox Life e a RTP 2 exibem estas duas magníficas séries no mesmo dia e à mesma hora!

NOTA EDITORIAL

Embora ontem, por motivo de força maior do seu autor, o «Expresso do Ocidente» não tenha podido ser publicado, a referida coluna está bem e recomenda-se. Assim sendo, Pedro Guedes da Silva regressará em força na próxima segunda-feira com o seu artigo semanal.

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

AGORA E SEMPRE OS CLÁSSICOS

Sou um peripatético, porque acredito que se aprende passeando e conversando, na linha do pensamento de Aristóteles. O que faz de mim patético, aos olhos dos patetas que enxameiam as modernas urbes. Antes assim.

AINDA E SEMPRE O MESTRE MANOEL DE OLIVEIRA

Manoel de Oliveira completou ontem 103 anos de vida, já se sabe. Cá para mim — bem sei que sou um pouco excêntrico, e que digo coisas estranhas... —, inscrevo-o na genealogia espiritual e cultural que tem as suas profundas raízes em Luís Vaz de Camões, o seu sólido tronco no Padre António Vieira, e os seus criativos ramos com Fernando Pessoa. Não me apetece agora falar sobre isto; mas, fica aqui o registo, para memória futura, porque é precisamente de Saudades do Futuro que se trata. Até lá, tentem ver todos os seus filmes — por ordem cronológica, como deve ser —, para depois passarmos à lição seguinte (que é só para iniciados) e ficarmos assim devidamente preparados para o III Milénio Lusíada que há-de vir um dia — numa manhã de nevoeiro, ou numa tarde de Sol, ou numa noite de Lua Cheia; ninguém sabe.

domingo, 11 de dezembro de 2011

UM CINEASTA ESPIRITUAL DE DIMENSÃO UNIVERSAL

Manoel de Oliveira faz hoje 103 anos. Ver todos os seus filmes é a melhor maneira de lhe darmos os Parabéns. E, além disso, é uma lição completa de História do Cinema: do Mudo ao Moderno, passando pelo Sonoro; do documentário à ficção; das vanguardas ao classicismo; do realismo ao fantástico. Finalmente, a complexidade da nossa misteriosa identidade nacional está toda plasmada na sua obra, em finas e subtis camadas sobrepostas. Veja-se, pois.

sábado, 10 de dezembro de 2011

LUA CHEIA

E, talvez por ser a última do ano, está magnífica, aparecendo e desaparecendo, por entre as nuvens, na noite húmida de Inverno.

DA LINHA EDITORIAL DO BLOGUE

Blogue que é blogue tem de ter qualquer coisa de almanaque. Ultimamente, tenho descurado essa parte; mas, vou já tratar disso.

SER-SE VERDADEIRAMENTE INDEPENDENTE É BOM?

É, na medida em que se pensa pela própria cabeça e se vive com a consciência tranquila, mas fica-se com a vida tramada pelo sistema cultural.

O QUE É QUE UM BLOGUE VERDADEIRAMENTE INDEPENDENTE FAZ?

Mostra caminhos alternativos ao pensamento único — culturalmente correcto — ditado pelas instituições da moda.

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

ARTE FOTOGRÁFICA DA MELHOR QUE HÁ

Um blogue de Luísa Ferreira.

O REI SOL



Com um abraço de agradecimento ao meu Cunhado e Amigo RBC.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

PINTURA DO DIA

Imaculada Conceição, 1618
DIEGO VELÁZQUEZ (1599 — 1660)

HINO DO DIA

Salve, nobre Padroeira
Do Povo, teu protegido,
Entre todos escolhido,
Para povo do Senhor.

Ó glória da nossa terra,
Que tens salvado mil vezes,
Enquanto houver Portugueses,
Tu serás o seu amor.

Com tua graça e beleza
Um jardim não ornas só,
Linda flor de Jericó,
De Portugal és a Flor!

Flor de suave perfume,
Para toda a Lusa gente,
Entre nós, em cada crente
Tens esmerado cultor.

Acode-nos, Mãe piedosa,
Nestes dias desgraçados,
Em que vivemos lançados
No pranto, no dissabor.

Lobos famintos, raivosos
O teu rebanho atassalham,
As ovelhas se tresmalham,
Surdas à voz do pastor.

Da fé a lâmpada santa,
Que tão viva outrora ardia,
Se teu zelo a não vigia,
Perde o restante fulgor.

Ai! da Lusa sociedade,
Se o sol do mundo moral
Se apaga… Ó noite fatal!
Ó noite de negro horror!

És a nossa Padroeira,
Não largues o padroado
Do rebanho confiado
A teu poder protector.

Portugal, qual outra Fénix,
À vida torne outra vez.
Não se chame Português
Quem cristão de fé não for.


Composto por Padre Francisco Rafael da Silveira Malhão (1794 — 1860).

O Hino da Padroeira foi composto por ocasião da proclamação do dogma da Imaculada Conceição, pelo Papa Pio IX, em 8 de Dezembro de 1854.

O 8 de Dezembro é o dia da Imaculada Conceição ou de Nossa Senhora da Conceição — Padroeira de Portugal a partir das Cortes de 1645-1646 do Reinado de D. João IV (8.º Duque de Bragança, em cujas veias corria o sangue de D. Nuno Álvares Pereira / S. Nuno de Santa Maria). Este Rei devolveu aos Portugueses uma Pátria livre, na sequência da Restauração da Independência Nacional levada a cabo pelos 40 Conjurados no 1.º de Dezembro de 1640.


Este é também o verdadeiro Dia da Mãe.


E é ainda o dia em que se deve fazer o Presépio em Família.

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

RESISTÊNCIA LUSÍADA

Podem-nos tirar tudo menos o luminoso Sol do aveludado céu azul de Lisboa.

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

EXPRESSO DO OCIDENTE

Quinta-feira, 1 de Dezembro
Quando o incrível parece confirmar-se, este 1º de Dezembro de 2011 terá sido celebrado pela última vez na condição de dia feriado. Estranhas escolhas de ainda mais raras criaturas, incapazes de atingir que sem a acção dos Conjurados que conduziu à Restauração da Independência em 1640, andariam hoje entretidos nas Cortes Generales a pensar se poderiam mandar o pagode trabalhar a 12 de Octubre - Día de la Hispanidad. É que os miguéis de vasconcelos de São Bento podiam mesmo ter cortado os feriados todos e mais alguns... menos este.

Sexta-feira, 2 de Dezembro
Depois da intervenção de Sarkozy ao anoitecer de quinta-feira, Frau Merkel anunciou esta manhã no Bundestag parte daquilo que tem em mente impingir aos restantes povos europeus com o tão prestimoso como idiota auxílio do húngaro que, por estes dias, ainda ocupa o Eliseu. A coisa tem sido tratada pela imprensa sem que se olhe com grande atenção ao fundo das propostas, como é aliás conveniente nestas coisas e apanágio de todo o processo de "integração europeia" - uma construção que se foi fazendo pelas portas dos fundos e sem grandes explicações para que os europeus notem a marosca o menos possível. Sabe-se aliás que sempre que alguém deu conta das notas de rodapé e a coisa foi levada a votos, sempre os referendos foram repetidos quando o resultado das urnas não foi coincidente com o desejo dos democráticos construtores do processo. Assim se passou na Dinamarca, em França ou na Irlanda, já para não falar da habilidade lusitana que nos prometeu um referendo para, como não fossem as sondagens suficientemente "seguras" às pretensões do governo europeu estabelecido em Lisboa, logo suprimir a intenção por artes mais ou menos mágicas.
Adiante, voltando às propostas de Merkozy. Querem então suas excelências, presume-se que sem direito a que as pessoas se pronunciem através do voto, instituir uma união fiscal e orçamental total, corolário do processo de liquidação de soberania a que temos vindo a ser sujeitos desde Maastricht. A receita é simples e desta feita consiste em retirar aos países europeus (e aos seus cidadãos, naturalmente) os pouquíssimos instrumentos de que ainda dispõem em matéria orçamental, intenção perceptível nas palavras da chanceler alemã (re)clamando "sanções imediatas": "deve ficar claro que qualquer violação das regras terá consequências" - uma tirada que, num mundo normal, teria indignado firmemente os diversos membros da União Europeia a quem a dupla de incapazes franco-alemã não passa aliás cartão. De forma pragmática e mais ou menos administrativa, anuncia-se um novo Tratado que ultrapasse as "limitações" (sempre as "limitações"…) do anterior e - a habitual cereja no topo do igualmente habitual bolo -, mais tomadas de decisão por maioria simples e qualificada e não por unanimidade, um "must" dos últimos Tratados. Não sendo bastante, ainda a senhora Merkel pretende obrigar os membros da zona euro a inscrever nas respectivas Constituições nacionais a célebre regra de ouro sobre os limites ao défice público. Ou seja, todo um cardápio de machadadas na já pouca soberania que resta, agora com a esfarrapada desculpa de só assim ser possível, de uma forma estrutural, descansar "os mercados".
Mas num quadro destes, quando é certo que as tais regras cuja violação implicará sanções imediatas significam para muitos dos países da zona euro anos de cortes e de sacrifícios provavelmente insustentáveis, poderá o avançar do processo de "integração à força" ser bem sucedido? Com esta carta de recomendações poderá a Europa subsistir tal e qual a conhecemos? Acaso a senhora Merkel já leu qualquer coisita sobre a sensibilidade da opinião pública do seu próprio país no pós-Tratado de Versailles, quando lhe foi imposto um registo de humilhação não muito distante daquele que agora quer oferecer a Atenas? Pergunto mais: já terá esta gente lido alguma História Universal, em edição de bolso que seja? Arrisco que talvez não. De outro modo saberiam que a tese do Fim da História não colhe merecimento e de que as construções artificiais feitas nas costas da vontade dos povos, no mais das vezes, acabaram inevitavelmente por tombar mais ano, menos ano. Ou pelo voto ou pela força.

Pedro Guedes da Silva

domingo, 4 de dezembro de 2011

ESTUDAR O PASSADO E PROJECTAR O FUTURO

Os anos 10 do século passado deram a Portugal o Integralismo Lusitano. A mesma década deu à Europa o Futurismo. Espero que 100 anos depois se comecem a desenhar novos movimentos — ideológicos e estéticos — do mesmo calibre.

sábado, 3 de dezembro de 2011

AINDA E SEMPRE OS ANOS 20 E 80

O que é que os anos 20 e 80 do século XX tiveram?
Esteticamente, foram vanguardistas. Ideologicamente, foram tradicionalistas. E, assim sendo, produziram uma nova e inovadora síntese histórico-cultural.
Cheira-me que os anos 20 e 80 do século XXI trarão uma renovada e renovadora síntese para Portugal e para a Europa.

SAUDADES DOS ANOS 80 [PARA A S.]

SECRETOS PRAZERES DO BLOGUE

Mudar de assunto sempre que me apetece.

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

ETERNAS SAUDADES DO FUTURO

O blogue Eternas Saudades do Futuro aproxima-se, a passos largos, dos 5 anos de vida (60 meses!). Será já, se Deus quiser, no próximo dia 21 de Janeiro de 2012.
Antes dessa marcante data, num pré-balanço (para os indivíduos das sondagens poderem prever o futuro...), passo a debitar os actuais números do blogue:
— 11.672 consultas ao perfil do autor.
— 5.202 mensagens publicadas.
— 101 seguidores.
— 168.745 visitas.
— 325.709 páginas vistas.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

1.º DE DEZEMBRO DE 1640


Dia da Restauração da Independência de Portugal.

Enquanto houver Portugueses,
o 1.º de Dezembro
será sempre evocado!

DA LEGITIMIDADE

A Legitimidade não é apenas determinada pelo direito dinástico do soberano. Para que esse direito exista, importa saber como se formula e adquire. Oiçamos Ribeiro Saraiva definir-nos a legitimidade: «La Légitimité ne consiste pas seulement en ce que Don Miguel soit la personne qui occupe le thrône, mais en ce que les véritables Contracts Sociaux, le véritable Droit Public Portugais, la véritable ancienne Constitution Nationale, soient observés».
Conforma-se a opinião do ilustre escritor tradicionalista e diplomata de El-Rei D. Miguel I com a opinião corrente dos publicistas. Por exemplo, de La Barre de Nanteuil já entendia que «a restauração da monarquia não é simplesmente o Poder restituído ao Rei, mas a restauração de todas as leis fundamentais do povo».
Não se veja agora, nem nos Contracts Sociaux, de Ribeiro Saraiva, nem nas Leis Fundamentais do Povo, de de La Barre de Nanteuil, um regresso ao mito romântico da vontade nacional. As leis fundamentais do povo são as liberdades municipais, corporativas e provinciais. Entre nós, com o serem os antigos foros e franquias do Reino, eram ainda os actos das Cortes de Lamego, que, se são apócrifas debaixo do ponto de vista histórico, tiveran força legal, por serem recebidos como direito político da Nação nas Cortes de 1641, que reconheceram como Rei legítimo a D. João IV.

ANTÓNIO SARDINHA
(1887 — 1925)

DO PATRIOTISMO

Ora o verdadeiro patriotismo — cem vezes o repetiu António Sardinha — não é o amor naturalista pela terra em que nascemos, é o respeito pelas gerações que nos precederam.

LUÍS DE ALMEIDA BRAGA
(1886 — 1970)

DEUS, PÁTRIA E REI



Sem Deus e a Pátria, para a Filosofia política portuguesa, o Rei é um fantasma, uma sombra, carimbo ou chancela, títere ou absurdo.
Onde falta Deus, o Rei é como uma árvore sem raíz, casa sem alicerce, poder sem legitimidade; onde falta a Pátria, o Rei não tem razão de ser, porque precisamente o conceito de Pátria é incompleto, se lhe falta aquilo que torna indispensável a existência da Realeza hereditária.
Estas três verdades são irredutíveis; porque se, sem Deus, a Pátria é um mito, sem o Rei, nem o poder de Deus encontra o seu legítimo executor, no mundo da Política, nem a Pátria possui o elo que prende eficazmente, através dos tempos, as gerações, e as torna solidárias ou colaboradoras na procura normal dos seus destinos. É por isto que me oponho sempre ao lugar-comum estafado da «Pátria ao alto!», muito da predilecção de certos pataratas, e não considero doutrinariamente monárquico o que o repete e aplaude.
(...)
E rejeito o lugar-comum, não porque subalternize a Pátria, é evidente; mas porque não distingo a Pátria da Realeza, visto a Pátria portuguesa ter sido obra da Realeza hereditária.
Há quem não goste de que se diga isto e de que se escreva isto. Mas os que não gostam fariam melhor se, em vez de não gostarem, estudassem a História do seu País...

ALFREDO PIMENTA
(1882 — 1950)