quinta-feira, 31 de janeiro de 2013
Todos os países têm o seu cineasta das mulheres. Encontrá-lo, e beber-lhe da filmografia pessoal, é meio caminho andado em direcção aos mistérios do eterno feminino. Curiosamente, ou talvez não, esses autores são sempre simultaneamente os maiores trágicos das respectivas cinematografias nacionais. Caracterizam-se ainda por superarem, nos seus filmes, as limitações mortais do erótico amor físico e do inocente amor platónico, através da redenção propiciada pelo amor louco, o qual é todo ele síntese — de corpo e alma —, porque fruto da força transgressora e libertadora — logo, criadora — da paixão, no seu profundo significado etimológico (passio), que nos convoca para a sacrificial dimensão do sofrimento pelo outro.
quarta-feira, 30 de janeiro de 2013
TERRA E POVO
Em 1953, ano em que apenas se produzem e estreiam cinco filmes em Portugal, anunciando assim uma tendência de empobrecimento, após os Anos de Ouro das décadas de 1930 e 1940, surge — como lufada de ar fresco e tiro no escuro — o melhor filme de sempre, da nossa cinematografia, sobre o Ultramar.
Chaimite, de Jorge Brum do Canto — autor maior da História do Cinema Português, completamente apagado nos dias de hoje pela historiografia oficial —, é a segunda longa-metragem nacional sobre a matéria. Facto estranho este, que confirma o inexplicável desinteresse dos nossos produtores pelo tema (que tem pano para mangas, aliás). É o primeiro filme da empresa de produção Cinal, dirigida pelo Professor Luís Pinto Coelho, que se caracteriza por películas de qualidade.
Jorge Brum do Canto atingiu, nesta obra, uma autenticidade nas reconstituições de época e militares, como nunca mais o nosso Cinema logrou alcançar. Se, no que diz respeito à imagem, ao som e à montagem, percebemos que estamos na presença de um esteta — Brum do Canto iniciou-se com a Geração de 1930, profundamente ligada à modernidade cultural portuguesa, onde também se perfilaram, como cinéfilos ou cineastas, Leitão de Barros, Cottinelli Telmo, António Lopes Ribeiro, Chianca de Garcia, Dr. Ricardo Jorge (médico, cinéfilo, escritor), João Ortigão Ramos, Dr. Félix Ribeiro (médico, cinéfilo, fundador e primeiro director da Cinemateca Portuguesa), Domingos Mascarenhas, e muitos outros, de igual calibre, que se constituíram como tertúlia cinematográfica no Cine-Teatro S. Luís (aberto em 1928) —, por outro lado, no que se refere à História, é um cineasta profundamente conhecedor do assunto abordado que avança para este arriscado registo épico de Chaimite.
O filme — na linha de Feitiço do Império (1940), de António Lopes Ribeiro — mostra o heróico esforço português para defender o Ultramar dos ataques estrangeiros — neste caso inglês, sendo assim premonitório das cobiças americana e soviética —, e não é, como muitas vezes erradamente se refere, uma fita contra a revolta vátua, nem, muito menos, contra a sua identidade enquanto povo. Digamos que é um filme pela positiva: eleva Portugal, respeitando os que se lhe opunham directamente; mas denuncia os ingleses, que pretendem levar os moçambicanos à revolta contra Portugal para alimentar os seus apetites imperiais.
Mouzinho de Albuquerque (interpretado por Jacinto Ramos) destaca-se como grande protagonista, herói e fio-condutor da narrativa, não apagando, note-se, os outros camaradas de armas — Caldas Xavier (Augusto Figueiredo) e Paiva Couceiro (o próprio Brum do Canto, num notável trabalho de actor).
É que este cineasta era o protótipo do artista-total: neste filme assina o argumento, os diálogos, a planificação, a realização, a montagem, e actua. Sabia-se ainda fazer rodear dos melhores: a demonstrá-lo encontramos na música Joly Braga Santos, e na fotografia — de belíssimos e ousados enquadramentos — César de Sá e Aurélio Rodrigues, para além de termos o Major Vassalo Pandayo como consultor militar.
A biografia de um criador contém, quase sempre, a chave para a sua Obra. Neste caso, a tradição familiar, em que Jorge Brum do Canto bebeu, revela-se fundamental. Nascido e criado numa família católica e monárquica — próxima da Família Real e amiga de Paiva Couceiro —, habituou-se a pensar pela sua própria cabeça — nunca se envolveu institucionalmente com o Estado Novo, embora dele fosse simpatizante — e foi um homem culto e livre. Sabemos que apreciava António Ferro, pelo projecto que este tinha para as Artes Nacionais, e, por sua vez, era admirado por Carmona.
Encontramos como tema principal do seu Cinema, nas suas próprias palavras, «a Terra e o Povo». Portugal e os Portugueses vão ser, assim, os protagonistas de uma filmografia que se esplana, entre 1929 e 1984, por 23 filmes — do vanguardista A Dança dos Paroxismos (1929) ao policial O Crime de Simão Bolandas (1984), passando por documentários e obras de ficção. Quem quiser encontrar a nação em toda a sua diversidade e plenitude, terá de ver A Canção da Terra (1938), Lobos da Serra (1942), Fátima, Terra de Fé (1943), Um Homem às Direitas (1945), e A Cruz de Ferro (1968).
Voltando a Chaimite: a acção desenrola-se, temporalmente, entre 1894, momento do ataque a Lourenço Marques pelos africanos, e 1897, altura em que Mouzinho, Comissário Régio de Moçambique, vence definitivamente os vátuas, derrotando Maguiguana, que tinha escapado durante a captura de Gungunhana. A fita alia este lado épico a um tom intimista, ao mostrar a Mulher de Mouzinho, presença discreta mas firme, verdadeira apoiante e companheira das empresas do herói. Paralelamente, o realizador dá-nos ainda uma história de amor entre um soldado e uma bela rapariga, com um final feliz. Cabe aqui destacar que Chaimite tem também valor como documento histórico para o estudo da vida colonial da época, que é retratada com verosimilhança e mestria, desde a da cidade até à do mato.
Para a «coisa militar», Brum do Canto baseou-se no livro A Guerra de África em 1895, de António Ennes, e em textos do próprio Mouzinho, o que assegura o rigor histórico-militar. Ainda no campo da autenticidade, é de realçar que os indígenas africanos falam nos seus dialectos próprios — muda a tribo, muda a língua —, criando assim um verdadeiro realismo, tão em voga nesses mesmos anos de 1950 noutras paragens. O difícil será, como neste caso, juntar, no mesmo filme, uma escala monumental, num registo de credível reconstituição histórica, a um intimismo de fino recorte humano. E, se termino falando na escala, é porque Chaimite atinge uma grandiosidade no tratamento do espaço e dos cenários, servindo o argumento na sua enorme dimensão épica, como nunca mais o Cinema Português — e, de um modo geral, a Arte Nacional — conseguiu fazer.
Saibam os jovens realizadores, activos em 2013, pôr os olhos em Chaimite, para se poderem aventurar em novas e belas criações, com som e imagens em movimento, nesta linguagem universal que o Cinema é — e que sai sempre enriquecida quando trata temas que dizem respeito aos Povos, como aqui bem se vê.
Veja-se, pois!
Nota: Artigo escrito para a revista Alameda Digital. Republicado em novas versões nos blogues Eternas Saudades do Futuro e Jovens do Restelo e no jornal O Diabo.
Chaimite, de Jorge Brum do Canto — autor maior da História do Cinema Português, completamente apagado nos dias de hoje pela historiografia oficial —, é a segunda longa-metragem nacional sobre a matéria. Facto estranho este, que confirma o inexplicável desinteresse dos nossos produtores pelo tema (que tem pano para mangas, aliás). É o primeiro filme da empresa de produção Cinal, dirigida pelo Professor Luís Pinto Coelho, que se caracteriza por películas de qualidade.
Jorge Brum do Canto atingiu, nesta obra, uma autenticidade nas reconstituições de época e militares, como nunca mais o nosso Cinema logrou alcançar. Se, no que diz respeito à imagem, ao som e à montagem, percebemos que estamos na presença de um esteta — Brum do Canto iniciou-se com a Geração de 1930, profundamente ligada à modernidade cultural portuguesa, onde também se perfilaram, como cinéfilos ou cineastas, Leitão de Barros, Cottinelli Telmo, António Lopes Ribeiro, Chianca de Garcia, Dr. Ricardo Jorge (médico, cinéfilo, escritor), João Ortigão Ramos, Dr. Félix Ribeiro (médico, cinéfilo, fundador e primeiro director da Cinemateca Portuguesa), Domingos Mascarenhas, e muitos outros, de igual calibre, que se constituíram como tertúlia cinematográfica no Cine-Teatro S. Luís (aberto em 1928) —, por outro lado, no que se refere à História, é um cineasta profundamente conhecedor do assunto abordado que avança para este arriscado registo épico de Chaimite.
O filme — na linha de Feitiço do Império (1940), de António Lopes Ribeiro — mostra o heróico esforço português para defender o Ultramar dos ataques estrangeiros — neste caso inglês, sendo assim premonitório das cobiças americana e soviética —, e não é, como muitas vezes erradamente se refere, uma fita contra a revolta vátua, nem, muito menos, contra a sua identidade enquanto povo. Digamos que é um filme pela positiva: eleva Portugal, respeitando os que se lhe opunham directamente; mas denuncia os ingleses, que pretendem levar os moçambicanos à revolta contra Portugal para alimentar os seus apetites imperiais.
Mouzinho de Albuquerque (interpretado por Jacinto Ramos) destaca-se como grande protagonista, herói e fio-condutor da narrativa, não apagando, note-se, os outros camaradas de armas — Caldas Xavier (Augusto Figueiredo) e Paiva Couceiro (o próprio Brum do Canto, num notável trabalho de actor).
É que este cineasta era o protótipo do artista-total: neste filme assina o argumento, os diálogos, a planificação, a realização, a montagem, e actua. Sabia-se ainda fazer rodear dos melhores: a demonstrá-lo encontramos na música Joly Braga Santos, e na fotografia — de belíssimos e ousados enquadramentos — César de Sá e Aurélio Rodrigues, para além de termos o Major Vassalo Pandayo como consultor militar.
A biografia de um criador contém, quase sempre, a chave para a sua Obra. Neste caso, a tradição familiar, em que Jorge Brum do Canto bebeu, revela-se fundamental. Nascido e criado numa família católica e monárquica — próxima da Família Real e amiga de Paiva Couceiro —, habituou-se a pensar pela sua própria cabeça — nunca se envolveu institucionalmente com o Estado Novo, embora dele fosse simpatizante — e foi um homem culto e livre. Sabemos que apreciava António Ferro, pelo projecto que este tinha para as Artes Nacionais, e, por sua vez, era admirado por Carmona.
Encontramos como tema principal do seu Cinema, nas suas próprias palavras, «a Terra e o Povo». Portugal e os Portugueses vão ser, assim, os protagonistas de uma filmografia que se esplana, entre 1929 e 1984, por 23 filmes — do vanguardista A Dança dos Paroxismos (1929) ao policial O Crime de Simão Bolandas (1984), passando por documentários e obras de ficção. Quem quiser encontrar a nação em toda a sua diversidade e plenitude, terá de ver A Canção da Terra (1938), Lobos da Serra (1942), Fátima, Terra de Fé (1943), Um Homem às Direitas (1945), e A Cruz de Ferro (1968).
Voltando a Chaimite: a acção desenrola-se, temporalmente, entre 1894, momento do ataque a Lourenço Marques pelos africanos, e 1897, altura em que Mouzinho, Comissário Régio de Moçambique, vence definitivamente os vátuas, derrotando Maguiguana, que tinha escapado durante a captura de Gungunhana. A fita alia este lado épico a um tom intimista, ao mostrar a Mulher de Mouzinho, presença discreta mas firme, verdadeira apoiante e companheira das empresas do herói. Paralelamente, o realizador dá-nos ainda uma história de amor entre um soldado e uma bela rapariga, com um final feliz. Cabe aqui destacar que Chaimite tem também valor como documento histórico para o estudo da vida colonial da época, que é retratada com verosimilhança e mestria, desde a da cidade até à do mato.
Para a «coisa militar», Brum do Canto baseou-se no livro A Guerra de África em 1895, de António Ennes, e em textos do próprio Mouzinho, o que assegura o rigor histórico-militar. Ainda no campo da autenticidade, é de realçar que os indígenas africanos falam nos seus dialectos próprios — muda a tribo, muda a língua —, criando assim um verdadeiro realismo, tão em voga nesses mesmos anos de 1950 noutras paragens. O difícil será, como neste caso, juntar, no mesmo filme, uma escala monumental, num registo de credível reconstituição histórica, a um intimismo de fino recorte humano. E, se termino falando na escala, é porque Chaimite atinge uma grandiosidade no tratamento do espaço e dos cenários, servindo o argumento na sua enorme dimensão épica, como nunca mais o Cinema Português — e, de um modo geral, a Arte Nacional — conseguiu fazer.
Saibam os jovens realizadores, activos em 2013, pôr os olhos em Chaimite, para se poderem aventurar em novas e belas criações, com som e imagens em movimento, nesta linguagem universal que o Cinema é — e que sai sempre enriquecida quando trata temas que dizem respeito aos Povos, como aqui bem se vê.
Veja-se, pois!
Nota: Artigo escrito para a revista Alameda Digital. Republicado em novas versões nos blogues Eternas Saudades do Futuro e Jovens do Restelo e no jornal O Diabo.
terça-feira, 29 de janeiro de 2013
AVISO AOS LEITORES
O Diabo, semanário fundado por Vera Lagoa e actualmente dirigido por Duarte Branquinho, traz publicado, na sua edição de hoje, mais um artigo cultural, sobre cinema, da minha autoria.
segunda-feira, 28 de janeiro de 2013
CADERNOS INTERATLÂNTICOS (1)
Quis o bom Amigo João Marchante, na sua inexcedível amabilidade,
oferecer-me espaço nesta sua Casa para, uma vez por semana, aqui deixar algumas
pinceladas do que me vai no espírito, reacção ao que foi, ao que é, e ao que –
julgo - pode vir a ser. Aqui e algures…
Reflexões, comentários, estados d´alma, um ou outro mot d´ordre, desabafos e até mesmo alguma lamentação quase fadista,
fica desde já assentado que cada palavrinha ou palavrota aqui debitada será da inteira
responsabilidade deste vosso modesto mas atrevido escriba.
Pois é tempo de visitas argentinas. No espaço de duas semanas procuro dar a
conhecer a amigos porteños alguns
tesouros do Portugal eterno (o Grande), tão teimoso na sua resistência aos embates
do anti-Portugal (o Portugalinho versão cravícola). Do Castelo de São Jorge ao
Mosteiro da Madre de Deus, de São Vicente de Fora aos Jerónimos, do Convento
dos Cardaes ao Museu Nacional de Arte Antiga, da Fundação Ricardo Espírito
Santo ao Museu dos Coches, de Queluz a Mafra, de Sintra a Óbidos, da Batalha a
Alcobaça, etc. E que dizer de duas deslocações ao Santuário de Fátima para orar
no local onde a Santíssima Virgem tantas vezes visitou e abençoou esta Terra de
Santa Maria!
Escusado será dizer que maravilharam-se com o que viram. Gente bem formada e bem informada,
demonstraram ser observadores atentos ao comentar, por exemplo, os seguintes
pontos:
1.º Na Patriarcal, nesta jóia
que é São Vicente de Fora, ao percorrer atentamente os grandes painéis com a
cronologia ilustrada da Igreja portuguesa, chamou-lhes a atenção o facto de
Salazar – “com quatro décadas entregues à restauração material e moral de sua
Pátria” – ser contemplado com uma curta frase a referir a nomeação como
Ministro das Finanças em 1928, enquanto Spínolas, Costas Gomes, Soares e demais
“coveiros de Portugal” merecem extensos textos e imponentes fotografias. Por essas e por outras é que a Igreja
conciliar dá muito, mas muito mesmo, que falar…
2.º No Mosteiro da Batalha, precisamente
no Museu das Oferendas ao Soldado Desconhecido (Liga dos Combatentes), em
secção destinada aos “grandes políticos e militares de Portugal”, espantaram-se
ao constatar que o selecto grupo compunha-se de notórios liberais e maçons,
como o Imperador Pedro I do Brasil mais os Saldanhas e Terceiras do costume,
além de revolucionários abrilinos do estofo de um Spínola, um Costa Gomes, um
Ramalho Eanes e – pasmai ó gentes! – o inevitável e desavergonhado
“descolonizador exemplar”.
3.º No belíssimo Museu dos
Coches, prestes a ser transferido para um caixote branco modernaço, fruto sabe-se lá de que negócio, repararam que se um
retrato de El-Rei D. Miguel encontra-se na galeria superior, já a colecção de
postais com os retratos dos Reis da dinastia brigantina, que se encontra à
venda na loja do museu, omite escandalosamente o “mais português” e “mais
católico monarca da Cristandade”.
Onde está a reacção a um tal estado de coisas? De facto, o espectáculo em Portugal
é confrangedor: dir-se-ia que o inimigo conseguiu neutralizar aqueles que não
afinam pelo mesmo diapasão. Nenhuma
publicação periódica, nenhuma editora, nenhuma livraria, nenhum programa de
conferências de peso, nenhuma iniciativa de doutrinação séria e sistemática,
nenhuma acção concertada para fazer frente ao regime da dissolução nacional.
Urge seguir o exemplo que nos vem do país dos argentinos, onde um revisionismo
histórico pujante e corajoso não apenas restaura factos, valores e personagens
do passado, mas reactualiza-os na sua urgência presente.
Marcos Pinho de Escobar
domingo, 27 de janeiro de 2013
O FIO-CONDUTOR INVISÍVEL DA TRADIÇÃO
Releio fascinado O Arco de Sant'Ana de Almeida Garrett. Aqui e ali volto a surpreender-me com algumas passagens do mais puro tradicionalismo. Levanto-me e vou à estante oposta buscar No Saguão do Liberalismo de Fernando Campos. E cá estão as mesmas frases do desencantado romântico liberal, a par de outras igualmente impressionantes de tantos homens de semelhante calibre: Antero, Eça, Herculano, Oliveira Martins, Ramalho Ortigão... Valham-nos compilações assim para termos à mão de semear o profundo pensamento dos que são conhecidos apenas superficialmente nos dias de hoje.
SANTO DE ONTEM, HOJE, AMANHÃ E SEMPRE
S. Tomás de Aquino (28.1.1225 — 7.3.1274). Doutor da Igreja.
Patrono especial de todas as Universidades e Escolas Católicas.
Patrono especial de todas as Universidades e Escolas Católicas.
Dediquei este fim-de-semana ao aprofundamento do conhecimento sobre a vida e a obra de S. Tomás de Aquino, através da releitura da brilhante biografia escrita por Chesterton. Daí, parti para a História da Europa de João Ameal. Em momentos assim, penso que deveria ter vivido no Século XIII... Pode ser que consigamos fazer no III Milénio algo parecido. Deus nos dê artistas, sábios, santos, heróis e reis como os desse Século de Apogeu da Cristandade.
sexta-feira, 25 de janeiro de 2013
CARTEIRA DE SENHORA
DIA 52
Fez seis anos, no dia
21 de Janeiro, este blogue do João Marchante, o blogue que decidiu adoptar-me.
Mesmo que quisesse, não podia ficar calada e não fico, claro.
Não acompanhei o
Eternas Saudades do Futuro desde o princípio, confesso. Quando apanhei o
comboio já a viagem ia a mais de meio. A partir daí, a distracção foi de tal
ordem que esqueci-me de me apear na estação e continuei viagem, textos fora,
imagens fora, vídeos fora, saboreando todas essas paisagens que o correr da
pena e da mente do João nos oferecem…
Lembro-me de no meu
blogue pessoal brincar com as estatísticas que o João apresentava, para
comparar a formiga com o elefante (acho que usei planetas, na altura). Fascinaram-me
as histórias do cinema, os aforismos, a estética, algum, se não todo, o pensamento
coincidente… Admirei especialmente a coragem, a determinação e a verticalidade
de quem caminha contracorrente e não é politicamente correcto.
Mal imaginávamos ambos
o resto de uma história em que ninguém vai acreditar se contada. Um dos maiores
responsáveis chama-se Mark Zuckerberg e podemos mover-lhe um processo se a
coisa correr mal.
E é assim que, quase
uma semana depois de o Eternas Saudades do Futuro ter idade para entrar para a
escola, celebra esta crónica um ano. Ou seja, de fraldas, a balbuciar palavras
que ainda não consegue dominar e olhando com veneração para os mais velhos.
Cinquenta e duas
crónicas contando com esta (a isto chama-se fazer batota). Cinquenta e dois
temas que tentei fossem variados.
Os leitores dirão se cumpri
o que previa no dia 1: “Escreverei com a maré dos dias, uns melhores que
outros, alguns de raiva, outros de puro divertimento.”
Claro que a
indisciplina não arredou pé. Com uma semana inteira entre crónicas, a minha
costela preguiçosa, estranhamente a mais activa e dominadora, não me dá tréguas
e obriga-me a deixar tudo para o último dia (prova viva de que sou portuguesa)
contribuindo decisivamente para atabalhoamentos, fraco vocabulário e tudo o
mais de que sois testemunhas.
Hoje não quero mesmo nada
escrever qualquer coisa que se assemelhe ao discurso de um político em dia de
inauguração ou de despedida. A minha relação com essa carreira profissional não
é das melhores, como certamente já se aperceberam. Por isso peço desculpa se
não conseguir o intento.
À casa que nos concede
hospedagem - a mim e à carteira – na pessoa do seu simpático proprietário,
agradeço a confiança com que instintivamente me escolheu e apadrinhou, a
paciência e o estímulo com que sempre fui acarinhada.
Aos que lêem esta
crónica, bem hajam pela paciência, o olhar compreensivo, as palavras encorajantes,
a mão protectora e o coração grande. Com ternura agradeço também a quem me
ampara desde sempre nas angústias das quintas.
Possa a Carteira de
Senhora sobreviver mais um ano aos atropelos infligidos por quem tem boa
intenção e pouca prática.
Leonor Martins de Carvalho
quinta-feira, 24 de janeiro de 2013
VALORES ATRAVÉS DOS REGIMES E DOS TEMPOS
Monarquia: Deus, Pátria e Rei.
Estado Novo: Deus, Pátria e Família.
Democracia: Adeus, pátria e família.
Estado Novo: Deus, Pátria e Família.
Democracia: Adeus, pátria e família.
DA IMAGEM E DA PALAVRA
Uma imagem vale mais do que mil palavras e uma só palavra sugere infinitas imagens.
RESISTIR À TENTAÇÃO DA IMAGEM
Aqui e agora, neste admirável mundo novo da Internet, basta carregarmos em meia-dúzia de teclas para irmos buscar uma mão-cheia de ícones que moram nas memórias dos menos jovens e que alimentam os sonhos dos adolescentes. Difícil é resistir, e mantermo-nos fiéis ao uso sóbrio e seco da palavra escrita. Mas, resistir é vencer. Serve este relambório todo como suporte teórico para justificar a seguinte comunicação aos leitores do blogue: deixarão de ser publicadas imagens no Eternas Saudades do Futuro.
quarta-feira, 23 de janeiro de 2013
NOVIDADE DO ANO NA BLOGOSFERA
Marcos Pinho de Escobar, autor do blogue Euro-Ultramarino, colaborador permanente da revista Alameda Digital e co-autor do blogue colectivo Jovens do Restelo, passará a ter uma coluna semanal às segundas-feiras no Eternas Saudades do Futuro.
DAS ÁRVORES E DAS RAÍZES
Milhares de árvores centenárias foram arrancadas pela raiz no passado fim-de-semana em consequência do temporal que varreu o país. Ninguém fala disso. Não admira. Esta genta moderna não gosta de árvores nem de raízes.
SUSPENSE
Alfred Hitchcock (1899 — 1980) nasce em Londres. Sendo, pois, à partida, um homem directamente herdeiro do espírito vitoriano do século XIX, revela, no entanto, um extraordinário sentido de utilização dos modernos meios de marketing e publicidade (antecipando-os), para divulgar as suas obras. Cedo irá transformar em marca icónica o seu nome, tornando-o reconhecível e apetecível para toda a comunidade mundial de cinéfilos, e, mesmo, para os grandes e despersonalizados públicos generalistas. Revela-se, ainda, e dentro desta estratégia de comunicação global, um especialista nas relações públicas; especialmente com a imprensa, com o objectivo de se promover profissionalmente.
Dito isto, há que afirmar, de imediato, que toda esta comunicação eficaz era apenas a ponta-de-lança de uma obra complexa e profunda. Vamos a ela, que é o fulcro da questão!
Hitchcock, oriundo de uma família de classe média-baixa, é instruído pelos jesuítas. Se refiro este facto é porque os seus filmes virão a reflectir uma série de conhecimentos que terá assimilado nos seus estudos feitos numa escola católica destes, bem conhecidos pela vasta cultura que forneciam; terá, também, através dos referidos jesuítas, tomado contacto com G. K. Chesterton (1874 — 1936), que lerá entusiasmado na juventude. Outras influências literárias que o marcaram, mais tarde, como erudito auto-didacta que era, foram Edgar Allan Poe (1809 — 1849) e Oscar Wilde (1854 — 1900).
Por outro lado, devorava jornais e lia revistas de criminologia e de cinema. Curioso é constatar o casamento entre estas fontes de inspiração para o seu despertar como autor de filmes. Os seus temas serão, principalmente, os seguintes: falsos culpados, assassínios, trocas de identidade, medo, voyeurismo, paixões frias mas arrebatadoras.
Porém, antes de chegar à realização de fitas, começa por desenhar intertítulos para filmes mudos, escrever argumentos e trabalhar como assistente de realização. Esta conjugação, de conhecimento prático da técnica cinematográfica com a cultura que ia adquirindo pela leitura, possibilita uma mestria na criação das suas narrativas fílmicas, apimentadas com o tão apregoado suspense.
Na sétima arte, Hitch (gostava de ser assim tratado) bebeu de várias fontes: Fritz Lang (1890 — 1976) e F. W. Murnau (1888 — 1931) — esses dois mestres do mudo alemão — foram determinantes para a estruturação da sua linguagem estética. Esteve na UFA — os grandes estúdios de Berlim — e conheceu-os pessoalmente. Lá trabalhou e lá filmou. Esta marca será visível, claramente, nos seus filmes mudos; e, mais subtilmente, nos sonoros.
O seu género eleito será o melodrama policial, pontuado de fantástico e de mistério. Esbate, pois, assim, as fronteiras de vários géneros convencionais, criando uma abordagem própria, com elementos retirados de todos eles.
No que toca à realização, o seu estilo é essencialmente visual, dando-nos a sensação de que aquelas histórias só fazem sentido em cinema; ou seja, por escrito não teriam o mesmo impacto. Sabia de tal forma o que queria que a montagem das suas películas seguia ao milímetro o que ele próprio tinha definido na planificação (última fase do argumento, em que este fica pronto a ser filmado). A esta atitude chama-se trabalhar com «guião de ferro». Hitch dizia que o acto de rodar era uma maçada, pois já sabia exactamente como seria o filme ao tê-lo definido na planificação. Esta ideia traduz uma inabalável confiança do cineasta em si próprio, enquanto director de actores, e uma invulgar capacidade de visualização.
Hitchcock assentava a sua estética numa cumplicidade com o espectador. Dava-lhe alguns conhecimentos secretos sobre a acção, mantendo-o ansioso pelo desfecho da narrativa. Esta tensão psicológica pode até levar o espectador a querer comunicar com a personagem ameaçada na tela, para a avisar do perigo... Eis a força manipuladora do suspense.
Não havendo, no entanto, técnica que resista à falta de ideias, é preciso deixar bem explícito que o cinema de Hitch assenta em temas fortes, já atrás referidos. Recapitulando, e desenvolvendo: culpa — com o inocente falso culpado como fio-condutor da narrativa, entrando aqui, por vezes, a troca de identidades; medo — pontuado pelo susto, e nas margens do terror; desejo — com simbologia e alegorias sexuais; ansiedade — mantida pelo suspense; voyeurismo — peeping-tom, em bom inglês, espreitando e violando a esfera privada e íntima; autoridade — que assegura a investigação criminal, mas também pode ser desafiada (detestava polícias vulgares, de «ronda»); morte — sob a forma de assassínio, o crime mais grave, e que os espectadores, morbidamente, gostam de ver no recatado conforto da sala escura. Todos eles temas de identificação e projecção psicológica do espectador. Eis o cinema, na sua mais poderosa forma alquímica, servido pela mão do mestre Hitchcock.
Importante é vencer o medo, esperar para ver o desfecho, e perceber que a chave dos seus filmes é o triunfo final da luz sobre as trevas. Toda a sua obra é uma variação sobre este principal grande tema.
E, se não menciono um único filme do realizador, a justificação é simples: devem ser vistos todos, cronologicamente — dos mudos aos sonoros, dos ingleses aos americanos, dos filmados a preto-e-branco aos rodados a cores —, com o objectivo de se conseguir captar, na sua plenitude, agora em 2013 mais do que nunca, toda a sua temática de fundo, e todo o seu estilo visual e sonoro profundo; enfim, todas as suas indeléveis marcas autorais.
Nota: Artigo escrito para a revista Alameda Digital. Republicado em novas versões no blogue Eternas Saudades do Futuro e no jornal O Diabo.
Dito isto, há que afirmar, de imediato, que toda esta comunicação eficaz era apenas a ponta-de-lança de uma obra complexa e profunda. Vamos a ela, que é o fulcro da questão!
Hitchcock, oriundo de uma família de classe média-baixa, é instruído pelos jesuítas. Se refiro este facto é porque os seus filmes virão a reflectir uma série de conhecimentos que terá assimilado nos seus estudos feitos numa escola católica destes, bem conhecidos pela vasta cultura que forneciam; terá, também, através dos referidos jesuítas, tomado contacto com G. K. Chesterton (1874 — 1936), que lerá entusiasmado na juventude. Outras influências literárias que o marcaram, mais tarde, como erudito auto-didacta que era, foram Edgar Allan Poe (1809 — 1849) e Oscar Wilde (1854 — 1900).
Por outro lado, devorava jornais e lia revistas de criminologia e de cinema. Curioso é constatar o casamento entre estas fontes de inspiração para o seu despertar como autor de filmes. Os seus temas serão, principalmente, os seguintes: falsos culpados, assassínios, trocas de identidade, medo, voyeurismo, paixões frias mas arrebatadoras.
Porém, antes de chegar à realização de fitas, começa por desenhar intertítulos para filmes mudos, escrever argumentos e trabalhar como assistente de realização. Esta conjugação, de conhecimento prático da técnica cinematográfica com a cultura que ia adquirindo pela leitura, possibilita uma mestria na criação das suas narrativas fílmicas, apimentadas com o tão apregoado suspense.
Na sétima arte, Hitch (gostava de ser assim tratado) bebeu de várias fontes: Fritz Lang (1890 — 1976) e F. W. Murnau (1888 — 1931) — esses dois mestres do mudo alemão — foram determinantes para a estruturação da sua linguagem estética. Esteve na UFA — os grandes estúdios de Berlim — e conheceu-os pessoalmente. Lá trabalhou e lá filmou. Esta marca será visível, claramente, nos seus filmes mudos; e, mais subtilmente, nos sonoros.
O seu género eleito será o melodrama policial, pontuado de fantástico e de mistério. Esbate, pois, assim, as fronteiras de vários géneros convencionais, criando uma abordagem própria, com elementos retirados de todos eles.
No que toca à realização, o seu estilo é essencialmente visual, dando-nos a sensação de que aquelas histórias só fazem sentido em cinema; ou seja, por escrito não teriam o mesmo impacto. Sabia de tal forma o que queria que a montagem das suas películas seguia ao milímetro o que ele próprio tinha definido na planificação (última fase do argumento, em que este fica pronto a ser filmado). A esta atitude chama-se trabalhar com «guião de ferro». Hitch dizia que o acto de rodar era uma maçada, pois já sabia exactamente como seria o filme ao tê-lo definido na planificação. Esta ideia traduz uma inabalável confiança do cineasta em si próprio, enquanto director de actores, e uma invulgar capacidade de visualização.
Hitchcock assentava a sua estética numa cumplicidade com o espectador. Dava-lhe alguns conhecimentos secretos sobre a acção, mantendo-o ansioso pelo desfecho da narrativa. Esta tensão psicológica pode até levar o espectador a querer comunicar com a personagem ameaçada na tela, para a avisar do perigo... Eis a força manipuladora do suspense.
Não havendo, no entanto, técnica que resista à falta de ideias, é preciso deixar bem explícito que o cinema de Hitch assenta em temas fortes, já atrás referidos. Recapitulando, e desenvolvendo: culpa — com o inocente falso culpado como fio-condutor da narrativa, entrando aqui, por vezes, a troca de identidades; medo — pontuado pelo susto, e nas margens do terror; desejo — com simbologia e alegorias sexuais; ansiedade — mantida pelo suspense; voyeurismo — peeping-tom, em bom inglês, espreitando e violando a esfera privada e íntima; autoridade — que assegura a investigação criminal, mas também pode ser desafiada (detestava polícias vulgares, de «ronda»); morte — sob a forma de assassínio, o crime mais grave, e que os espectadores, morbidamente, gostam de ver no recatado conforto da sala escura. Todos eles temas de identificação e projecção psicológica do espectador. Eis o cinema, na sua mais poderosa forma alquímica, servido pela mão do mestre Hitchcock.
Importante é vencer o medo, esperar para ver o desfecho, e perceber que a chave dos seus filmes é o triunfo final da luz sobre as trevas. Toda a sua obra é uma variação sobre este principal grande tema.
E, se não menciono um único filme do realizador, a justificação é simples: devem ser vistos todos, cronologicamente — dos mudos aos sonoros, dos ingleses aos americanos, dos filmados a preto-e-branco aos rodados a cores —, com o objectivo de se conseguir captar, na sua plenitude, agora em 2013 mais do que nunca, toda a sua temática de fundo, e todo o seu estilo visual e sonoro profundo; enfim, todas as suas indeléveis marcas autorais.
Nota: Artigo escrito para a revista Alameda Digital. Republicado em novas versões no blogue Eternas Saudades do Futuro e no jornal O Diabo.
terça-feira, 22 de janeiro de 2013
PAUSA PARA BALANÇO E PARA TOMAR BALANÇO...
Depois de 6 anos de intensa actividade diária, completados ontem neste blogue, com 5710 mensagens publicadas, 124 seguidores, 203272 visitas, 377802 páginas vistas, 13215 visualizações do perfil do autor, continuo com os olhos postos no futuro. Assim sendo, há permanentes e renovadas razões para os interessados visitarem diariamente o Eternas Saudades do Futuro. A saber: Leonor Martins de Carvalho continuará a ter aqui publicadas as suas crónicas às sextas-feiras e um novo convidado semanal estrear-se-á já na próxima segunda-feira...
SUSPENSE...
O Diabo, semanário fundado por Vera Lagoa e actualmente dirigido pelo meu bom amigo Duarte Branquinho, publica hoje mais um artigo da minha autoria.
segunda-feira, 21 de janeiro de 2013
NO DIA DOS 6 ANOS DO BLOGUE
Saudade
Para o João
Um texto para o aniversário de uma casa blogosférica de um
amigo, que frequento amiúde, corre sempre o risco de se tornar um exercício
laudatório desprovido de qualquer interesse. Vou tentar evitá-lo; é apenas o
que prometo.
O meu encontro com o João foi há mais tempo do que é
possível contar. Nestas Eternas Saudades do Futuro encontro-o sempre que quero
– sempre igual a si próprio. E encontro-me com ele na Cultura, seja no Cinema, na
Fotografia, na Pintura, nos livros – sempre os livros – e, claro, em Portugal,
numa História que nos une, numa identidade que nos marca, numa essência que é
nossa.
Escreveu António Quadros que “a saudade do futuro é uma
paixão que animou toda a nossa história, como inspira toda a nossa cultura, fautora
de acertos ou de erros, mas sempre omnipresente. O hoje é uma passagem
evanescente entre um ontem que remonta às origens e um amanhã que é para nós
mais, bem mais do que um mundo simplesmente melhor do que este, é um reino da
primazia do espírito e dos seus valores, para o qual, consciente ou
inconscientemente, trabalha tudo o que em cada um de nós é altruísta, dadivoso,
generoso, visionário”. Como o João encarna na perfeição estas sábias e
profundas palavras! O nome do seu blog
não é um acaso, é uma exactidão.
Podia rever todos os bons momentos que passámos, mas para
mim, como para ele, as saudades são do futuro.
Duarte Branquinho
Duarte Branquinho
domingo, 20 de janeiro de 2013
SANTO DO DIA E REI DO DIA
288 — Morre S. Sebastião, Defensor da Igreja, Mártir.
1554 — Nasce D. Sebastião, O Desejado, Rei de Portugal.
1554 — Nasce D. Sebastião, O Desejado, Rei de Portugal.
sábado, 19 de janeiro de 2013
ENTREVISTA CONCEDIDA PELO AUTOR DO BLOGUE
Na sequência duma interessantíssima conversa que tive ontem numa rija tertúlia de cavalheiros da velha guarda que se orientam pela trilogia Deus-Pátria-Rei, publico novamente a entrevista que concedi, no dia 27 de Fevereiro de 2009, ao Manuel Azinhal, autor do saudoso blogue O Sexo dos Anjos. E se a republico aqui e agora é porque voltaria hoje a responder a tudo da mesma maneira. Ei-la:
1 - "Eternas Saudades do Futuro" é um projecto assumidamente individual. O que o levou a optar por esse modelo?
- O Eternas Saudades do Futuro é, de facto, um blogue pessoal — pessoalíssimo, até. Não resulta da razão, mas, sim, do coração, isto é, o que lá publico ocorre-me intuitivamente. Portanto, não se pode falar em opção. Porém, acredito que o que nos sai automaticamente é resultado da cultura que transportamos connosco: a que vem do berço, e a que adquirimos nas voltas da vida, com as respectivas opções estéticas e éticas, fruto dos mestres que nos ensinaram a ver, compreender e escolher.
2 - Gosta de se sentir um "redresseur des torts"?
- Não sei se estou à altura de tão nobre tarefa, correspondente a tal epíteto. Certo, certinho, é que nasci na época errada e tento viajar no tempo — afinal, temos 900 anos de História por explorar, com heróis, sábios e santos — procurando energia nas lições do passado para me projectar num renovado futuro. Sinto-me um vanguardista nas formas e um tradicionalista nos valores; contudo, procuro ainda a coerência que advirá da síntese desses dois vectores. Na arte e na vida.
3 - Quais as razões para que seja tão curto o tempo médio de vida dos blogues?
- Os portugueses têm muita dificuldade em acabar aquilo que começam. Também não lidam bem com a pontualidade. São, ainda, preguiçosos. Detesto todas essas características, que me fazem, aliás, assumir cada vez mais uma atitude misantrópica perante a gente que me rodeia e ter nos livros os melhores amigos. É ridículo observar que há blogues muito bem escritos mas totalmente vazios de ideias e vice-versa. Aproveito esta divagação, em tom de desabafo, para dizer que um blogue tem de ser sustentado por autenticidade e cultura. Estas duas características escasseiam, igualmente, hoje.
4 - Depois destes anos todos a observar a blogosfera, o que lhe parece que esta trouxe de novo à batalha das ideias e da informação?
- Perante o espanto e a admiração geral, a blogosfera portuguesa veio mostrar que há pessoas, desalinhadas com o pensamento único ditado pelo politicamente correcto, que pensam pela sua própria cabeça e que não se conformam com a ditadura cultural consentida por um sistema que há muito entregou aos intelectuais de esquerda a hegemonia cultural. O sistema trata da economia e dá de mão-beijada as artes e as letras a esses intelectuais. Uns e outros, ficam todos contentinhos com o acordo.
5 - O que espera ainda da blogosfera?
- Tudo. Pois só aqui Portugal poderá recuperar as tradicionais liberdades (que não a fictícia Liberdade) que nos foram legadas por D. Afonso Henriques e seus cavaleiros e que se têm vindo a perder irreversivelmente de há 200 anos para cá. Ena pá!, o que eu fui dizer...
6 - A forma mais eficaz de fazer política passa por dizer que não se faz?
- Não sei, eu não faço política...
7 - Comente as seguintes afirmações:
a) Só pode progredir o que permanece.
- Sem dúvida. Resistir é vencer, e vencer corporiza-se na belíssima imagem de um homem de pé entre as ruínas. O futuro é feito do que permanece depois de evaporada a espuma dos dias. Esse caudal que avança — de geração em geração —, unido por um invisível fio-condutor, é a Tradição. É por aí que vou.
b) Bloguismo rima com narcisismo.
- Já se sabe que bloguismo rima com diarismo; no entanto, importante é ter consciência que bloguismo rima com activismo: os blogues são as catacumbas do nosso tempo.
c) A internet abriu o caminho a um gramscismo tecnológico.
- Percebo pouco disso... Mas, a despropósito, apetece-me dizer, para rematar, que só haverá mudança de paradigma político se existir um ambiente cultural propício. Este, terá de ser necessariamente enformado por uma nova estética. Para mal dos nossos pecados, a esquerda percebeu isso no século XVIII. Reedificar a comunidade nacional orgânica, assente em valores tradicionais, que tem vindo a ser destruída desde aí, será tarefa só possível através da argamassa cultural fabricada na internet.
sexta-feira, 18 de janeiro de 2013
CARTEIRA DE SENHORA
DIA 51
Não sou nada o género
de pessoa adepta de resoluções de Ano Novo, mas afinal sempre tomei uma: deixei
de comprar o passe social e de andar de autocarro. De agora em diante apenas
usarei transporte público em dias de chuva intensa, já que dias de neve
dificilmente verei em Lisboa, ou para distâncias verdadeiramente
intransponíveis para estas pernas. Claro que para a carteira é indiferente, o
tiracolo é o mesmo e sempre lhe vou dando a conhecer esta cidade.
As caminhadas, pelo
menos as matinais, fazem-me atravessar com nostalgia um dos bairros de Lisboa
ligado à minha adolescência, onde porta sim, porta sim, morava alguém do grupo
juvenil que por ali se encontrava aos sábados, numa animada mistura entre os que
pertenciam a grupos da paróquia, outros que andavam no mesmo liceu e ainda outros
que se conheciam desde pequenos. Nem era oficialmente o meu bairro como tal definido
em alguma portaria municipal, mas como vinha de um bairro adjacente, adoptámo-nos
mutuamente.
O bairro era nosso, todo
por nossa conta nesses longos sábados, até porque não havia electronicices a
roubarem tempo ao tempo de estarmos juntos. Sabíamos quem morava em cada
prédio, conhecíamos-lhe todos os recantos. Assistimos à sua degradação
progressiva por má qualidade de construção e falta de capital dos senhorios
para a sua manutenção. Acabaram no chão as casas, e muitos foram saindo do
bairro. Vimos serem construídos novos prédios, primeiro os caixotes, feíssimos,
seguindo-se a inteligente moda dos revestidos a vidro, apropriadíssima para a eterna
falta de sol em Lisboa. Afinal, os ares condicionados tinham de se vender.
Agora, todas as manhãs
revejo alguns dos prédios que conhecia de cor e ainda estão de pé, por vezes entalados
entre dois novos, mas orgulhosamente reabilitados e a chamar as minhas memórias
dos que lá viviam e daqueles sábados eternos.
Nós, os lisboetas,
temos uma relação amor-ódio com a cidade. Deve ser lugar-comum dizer isto, porque
provavelmente acontece o mesmo com todos os outros habitantes de todas as
outras cidades. Paciência.
Odiamos Lisboa quando
está suja, quando só vemos buracos, quando nos lembramos de como era na nossa
infância, quando imaginamos como seria na dos nossos pais, quando percebemos o
muito que foi destruído. Esta sandice da destruição não parece ter paralelo,
pelo menos em quantidade, e é, como de costume, contracorrente. Enquanto outros
tentam preservar, aqui continua a saga parola do (lá volta ele!) complexo do
“moderno”. Ainda há pouco tempo arrancaram candeeiros centenários no Terreiro
do Paço. Até gosto de muita arquitectura de hoje em dia, mas se é de hoje, e nos
casos em que a de ontem pode ser preservada, porquê destruir e construir
exactamente aí? E que dizer ainda do embuste de muitas “salvações” de fachadas?
Amamos Lisboa quando,
nem que seja por minutos, o nosso olhar é de criança e de turista, quando
viramos uma esquina e surge aquele beco mesmo à nossa espera, ou nos surpreende
uma nesga de vista de rio numa viela, uma velhinha à janela, nomes inesperados de
ruas, calçadas, travessas, becos e vielas, quando reconhecemos os pequenos sinais,
às vezes minúsculos que nos contam a sua História.
Pode ser que a tal
relação dos lisboetas com a sua cidade seja afinal mais amor-tristeza. Uma
tristeza imensa pelo amor imenso que lhe temos.
Já o Sol, que conhece
Lisboa de lés a lés, ama-a e, romântico, oferece-lhe descaradamente a luz na
esperança de nunca se separar dela.
Leonor Martins de Carvalho
quinta-feira, 17 de janeiro de 2013
BLOGOSFERA NACIONAL
Quase dez anos volvidos sobre o aparecimento na blogosfera de uma corrente nacional, no Verão de 2003, o que resta hoje dela?
quarta-feira, 16 de janeiro de 2013
ALEGRIA DE VIVER
Em Dezembro de 1932, iniciaram-se os trabalhos de edificação do estúdio cinematográfico da Tobis, na Quinta das Conchas, ao Lumiar, em Lisboa. No início do ano, tinha sido dado o arranque para a Companhia Portuguesa de Filmes Sonoros Tobis Klang Film, que se constituiu formalmente em Junho de 1932. Este nome ficou a dever-se à casa-mãe alemã (Tobis, abreviatura de Tonbild SyndiKat), por ter sido esta a fornecer-lhe a aparelhagem técnica. Lisboa e Berlim surgem assim de mãos dadas, para o advento do Cinema Sonoro em Portugal.
O então jovem arquitecto Cottinelli Telmo desenha e orienta a construção do estúdio, num radical projecto de fino recorte moderno e funcional, em articulação com a bela paisagem envolvente. José Ângelo Cottinelli Telmo nasceu em Lisboa, em Novembro de 1897, e viria a morrer num trágico acidente de pesca desportiva na Praia do Guincho, sportsman que era, em 1948. Filho de músicos, entra em 1915 para as Belas-Artes de Lisboa, a fim de cursar Arquitectura. Antes de aí se licenciar, em 1920, Cottinelli participa nas animadas tertúlias do Chiado, onde convive com os «novos», virando as costas ao academismo passadista da escola. Dessas relações sairiam, por exemplo, trabalhos para bailados (com Almada Negreiros), bandas desenhadas (para o ABC), décors de filmes de Leitão de Barros, e etc. e tal. Revelou-se, ainda, como actor e compositor, nas festas de estudantes de Belas-Artes. Como arquitecto, constrói alguns dos primeiros edifícios modernistas de Lisboa: Stand da FIAT (Av.da Liberdade, 1926-1929); Estação Fluvial do Terreiro do Paço (1928-1932); e, finalmente, a nossa Tobis. Carreira esta que atingiria o apogeu com a sua nomeação para arquitecto-chefe da Exposição do Mundo Português, em 1940.
Foi, por esta altura, o principal colaborador de Duarte Pacheco (se este não tivesse morrido em 1943, Cottinelli em 1948, e Ferro em 1956, a História das Artes e dos Espectáculos, no Século XX, em Portugal, teria cantado mais alto… mas, essa é outra história… fica para a próxima).
A Tobis só ficou concluída no ano de 1934. No entanto, antes disso, Portugal vai ter o seu primeiro filme sonoro rodado aí, num plateau improvisado. Ao mesmo tempo que orienta a construção do estúdio, que, no local, era dirigida pelo francês A. P. Richard, Telmo escrevia e realizava A Canção de Lisboa, tendo como conselheiro técnico Chianca de Garcia, outro dos grandes entusiastas da Tobis, desde a primeira hora, a par de Cottinelli Telmo e Leitão de Barros.
A Canção de Lisboa (Portugal, 1933) surge, pois, como fruto da gente nova, formada na cinefilia, no culto das Artes, e no bom-gosto. Se esta nova geração está pronta, e as infra-estruturas lançadas no terreno, faltavam ainda técnicos e actores para dar corpo ao primeiro filme sonoro totalmente feito (rodado e sonorizado) em Portugal.
Olhando com atenção para a ficha técnica (hábito perdido nos apressados dias de hoje, onde nos servem ao domicílio os filmes amputados dessa parte), descobrimos toda a fina-flor da Arte Portuguesa de então. O próprio genérico é de Almada Negreiros, que desenha também os dois cartazes do filme; o pintor Carlos Botelho é assistente de realização; José Galhardo escreve os inesquecíveis diálogos e as letras das canções, que passam de pais para filhos há exactamente oitenta anos; encontramos um trio de luxo na fotografia — Henri Barreyre, Octávio Bobone e César de Sá; o «russo branco» — vindo do Cinema Mudo Russo (pré-soviético; pois não foram os comunistas que lá inventaram o Cinema, como alguns parecem pensar) — Chakatonny; o engenheiro Paulo de Brito Aranha na direcção de som (cargo que iria manter na Tobis, por largos anos); o poeta José Gomes Ferreira — esse mesmo! — na assistência de montagem; Raul Ferrão e Raul Portela na autoria da música das canções; e, por aí fora…
Os actores constituem um elenco «de se lhe tirar o chapéu»: Vasco Santana, Beatriz Costa, António Silva, Teresa Gomes, Álvaro de Almeida, Manuel Santos Carvalho, e o jovem realizador Manoel de Oliveira, numa breve aparição como o galã, bon-vivant (que, de facto, era) e fiel amigo, Carlos, do desgraçado Vasquinho (Vasco Santana).
A articulação entre as equipas técnica e artística contou com a preciosa colaboração de técnicos profissionais vindos, essencialmente, da Alemanha e de França: Hans-Christof Wolhrab, Tonka Taldy, Jeanette Pakon, para além dos já nomeados anteriormente.
Sinal dos tempos, é de referir que Beatriz Costa saía de uma peça de teatro de revista, em cena na altura, onde era cabeça de cartaz, às duas horas da manhã, e apresentava-se às sete horas, da mesma manhã, na Tobis, impecavelmente maquilhada, à espera da ordem: «Acção!».
Por tudo isto, estamos perante um filme fundador: não só do Cinema Sonoro Português, mas do género fílmico da Comédia Portuguesa. Até hoje, tudo o que se tenta fazer, neste domínio, continua a ter como referência e influência A Canção de Lisboa.
Não vamos contar aqui a história da fita, pois ela está gravada na memória colectiva das famílias da nossa Terra. Parece-me é ser importante, para os intelectuais desconfiados do género cómico, lembrar que, à época, também René Clair e Jean Renoir o praticavam, na Europa; e, vendo a nossa Canção ao lado dessas películas, percebemos que o Cinema Português esteve alinhado com o «espírito do tempo» e conseguiu — simultaneamente — ser espelho da comunidade lisboeta, em todos os seus detalhes de puzzle social complexo, por de trás de uma aparente simplicidade brejeira.
Não basta, de facto, olhar. É preciso ver. E, para isso, há que lavar os olhos entre dois olhares, libertando-os de preconceitos aviados em estilo erudito por certos escribas da nossa praça que conseguem descortinar maravilhas nos mais obscuros objectos (antes fosse o do Buñuel) e cegar perante a luminosidade d’A Canção de Lisboa.
Aproveitemos a Quadra de Vida, que é o Natal, para a revermos — em Família — nos oitenta anos da sua estreia, que neste ano de 2013 se comemora.
Alguns cépticos perguntarão ainda: «Mas o que é que a fita tem?». Tem uma história bem contada — o estudante de Medicina, apaixonado pela costureirinha do bairro, filha de um «pai tirano», surpreendido pelas velhas tias tontas, mas ricas, e provincianas —, diálogos de extraordinário ritmo — ditos com irrepreensível dicção, e cheios de segundos sentidos e trocadilhos —, actores que representam com alegria e vivacidade, uma bela estrutura musical, o fado, o lirismo, os sentimentos — sem ser sentimentalista —, as piadas, a psicologia do Povo Português (Lisboa como síntese da Alma Nacional) apresentada com naturalidade e com subtil — quase invisível — profundidade.
Tão simples… e tão difícil de fazer de novo!
Nota: Artigo escrito para a revista Alameda Digital. Republicado em novas versões nos blogues Eternas Saudades do Futuro e Jovens do Restelo e no jornal O Diabo.
terça-feira, 15 de janeiro de 2013
NOS 80 ANOS D'«A CANÇÃO DE LISBOA»
O Diabo, semanário superiormente dirigido pelo meu ilustre amigo
Duarte Branquinho, publica hoje um artigo deste vosso humilde autor.
segunda-feira, 14 de janeiro de 2013
DO FUTURO DO CINEMA PORTUGUÊS
Um País que não tenha uma Cinematografia própria, reconhecida de imediato a olho nu pelos cinéfilos do mundo inteiro através das suas marcas identitárias, não tem futuro. Não se trata de filmar o folclore e de registar as belas paisagens — a publicidade (institucional e comercial) tomou conta desse departamento, para vender o seu peixe, e até o faz bem.
O que quero dizer com isto é que Portugal precisa de fazer um Cinema com uma linguagem autêntica, que corresponda de facto ao modo de pensar e sentir dos Portugueses. O teste parece-me fácil: se o público gostar é porque os filmes são genuínos. Este tornou-se, aliás, o principal problema; as pessoas andam zangadas com os filmes portugueses. Como às vezes sucede na vida, até se zangam com o que desconhecem; mas, cheira-lhes que nem vale a pena espreitar. E — atente-se —, o povo é sábio nos seus instintos, por mais ignorante que possa parecer e — hoje, infelizmente — ser.
O Cinema é uma necessidade cultural do século XXI, como já tinha sido, também, durante todo o século XX — ou, pelo menos, desde que criou, para si próprio, as bases estéticas para se exprimir de forma autónoma em relação às outras Artes (esse nascimento da linguagem cinematográfica deu-se com Griffith, em 1915). Portanto, se um País não for capaz de criar produtos no domínio da maior indústria cultural conhecida, é lícito afirmar-se que está a abrir uma brecha para a entrada de filmes estrangeiros que venham ocupar esse espaço. Não há aqui qualquer nostalgia do tipo «patriotismo da sardinha assada», que, desde sempre, me repugna. Há, isso sim, a consciência de que um Povo só tem futuro se existir culturalmente, e que, sendo o Cinema a maior e mais moderna forma de expressão artística, quem não tem filmes, a que possa chamar seus, é como quem não tem Língua.
Os filmes de uma Cinematografia Nacional reconhecem-se de imediato. Todos nos quedamos fascinados perante o Cinema Clássico Americano (o das décadas de 1930 e 1940), como certamente admiramos — os que o conhecemos… — o Cinema Mudo Alemão e Russo, ou, ainda, nos identificamos com o Cinema Moderno Italiano e Francês, para só falar dos exemplos mais divulgados da História do Cinema.
A estas fitas associamos rostos e corpos — as «estrelas» (do que os americanos chamaram «Star System»). Reside aqui uma lacuna nacional a superar urgentemente: o Cinema Português precisa de novas estrelas, como de pão para a boca. São elas que alimentam os sonhos dos espectadores na sala escura, através de processos de identificação ou negação, amor ou ódio, fascínio ou repulsa (sem entrar em tretas psicanalíticas, que só servem par esvaziar de magia e sensualidade personagens e pessoas). Certo, certinho, é que sem o brilho das estrelas o Cinema não cativa. Uma estrela é mais do que um bom actor. Tem aquele «não sei o quê» que só o espectador, no seu íntimo, sabe reconhecer; e, primeiro do que ele, o realizador — a quem cabe a tarefa de descobrir, revelar e lançar esses seres únicos. Apesar de tudo, Portugal teve já as suas «divas» do celulóide.
Outro aspecto fundamental a não perder de vista são as histórias que estão na base dos filmes. Tecnicamente designados por argumentos ou guiões — após a sua passagem para linguagem cinematográfica —, é nestes que reside o segredo do sucesso das películas.
A propósito, ocorre-me dizer o seguinte: «Pela boca morre o peixe»; isto é, podemos ter uma iluminação magnífica, belos enquadramentos, actores irrepreensíveis, e tudo o mais; mas, se os diálogos forem ridículos — sabem do que estou a falar… —, a fita não tem pernas para andar.
Antes de chegar aos diálogos, no entanto, o tropeção pode ainda dar-se numa outra fase — na história, propriamente dita (aproveito a ocasião para perguntar se alguém sabe porque carga de água é que ultimamente aparece história impropriamente escrita?...). Esta, pode ser baseada numa obra literária (falando-se, assim, em adaptação), ou escrita de raiz (argumento original). Aqui, é obrigatório ter a noção de que escrever para Cinema não é o mesmo do que escrever um livro ou ser-se jornalista… Há toda uma técnica que urge aprender e dominar. Graças a Deus, temos bons exemplos portugueses para estudar.
Se o Cinema é a Arte da repetição (mas essa é outra conversa), aproveito para deixar aqui mais um dito que anda na boca do nosso povo há anos, e que reza mais ou menos assim: «Tendo nós novecentos anos de História, com tantas histórias, porque é que não retiramos daí inspiração para criarmos argumentos para os nossos filmes?». Pois… Não sei, ou prefiro não saber. Mas, é fácil de perceber que a vida de Dom Afonso Henriques daria uma extraordinária longa-metragem, com todos os ingredientes de que os espectadores gostam: um herói, acção, aventuras, perseguições, sexo, amor, batalhas, viagens, paisagens, mistério, segredos, traição, ódio, sangue, e por aí fora… Já que estamos lançados, aproveito para lembrar que todo e qualquer um dos nossos Reis daria um filme de fundo bom em qualquer parte do planeta. Não é exagero, é uma convicção formada no visionamento e análise de centenas de filmes históricos. Um possível slogan para estas películas de época seria: «Oitocentos anos de Monarquia são a nossa garantia».
Pelo meio — entre as histórias, que se escrevem e planificam a fim de passarem a imagens em movimento com som e tudo, e as estrelas, também já nossas conhecidas, que brilham na tela — ficam os recursos técnicos de várias áreas estéticas: imagem, som, montagem, direcção artística (cenários e guarda-roupa). Nestas matérias, não julgo haver problemas de maior. Afinal, temos dos melhores profissionais do mundo nestes ofícios artísticos. Bem sei que alguns andam lá por fora a lutar pela vida, mas talvez regressem para ajudar a criar, definitivamente, uma Indústria de Cinema em Portugal. Havendo mercado, haverá dinheiro e remuneração condigna para quem a merece.
Falemos então agora de mercado, palavra que aparentemente não cola com Arte. Mas se não casar é que é o diabo, pois a Arte ficará solitária e estéril… É chegada a hora de deitar fora todos os preconceitos contra a relação dos filmes com o público. As fitas só têm razão de ser na medida em que comuniquem com as pessoas e que estas se revejam nas películas. Tudo isto pode — e deve — ser feito sem cedências de carácter artístico. Um bom filme deve ser fruído por toda a gente (note-se que o público não é uma massa e é composto por indivíduos de culturas e sensibilidades distintas), com prazer e proveito, à medida dos seus apetites estéticos, ou, simplesmente, lúdicos.
Entendamo-nos: os mais simples contentar-se-ão com a superfície do filme, os mais atentos mergulharão na história, e os mais exigentes tirarão as suas próprias conclusões. As grandes fitas estão assim construídas. São feitas a pensar em todos, mas à medida das necessidades e capacidades culturais de cada um.
É tudo tão simples que quando oiço para aí certos pequenos e médios intelectuais da nossa praça a escreverem palavras extraordinárias sobre Cinema, que só servem para complicar o que é claro como a água límpida, até me arrepio todo.
Finalmente, guardei ainda um pouco de tinta para falar de financiamentos. Embora Portugal tenha hoje — mais do que nunca — uma burguesia burgessa, inculta, e pouco dada a investimentos culturais (salvas raríssimas e honrosas excepções), é aí — apesar de tudo — que reside a esperança para um salto de escala da produção nacional. Os cineastas do futuro terão de libertar-se dos subsídios, e começar a pensar na preparação dos seus projectos com outras mais saudáveis engenharias financeiras. Todas as grandes Cinematografias estrangeiras (tirando a Soviética) se edificaram sobre uma estrutura económico-financeira empresarial privada. Já tinham reparado nisso?
E, por aqui me fico, antes que ofenda alguma alma mais sensível de algum confrade cinéfilo...
Apesar de todo o meu desgosto, atrás expresso, em relação ao actual panorama do Cinema Português neste ano de 2013 (sendo sério, não poderia ter dito outra coisa), a minha esperança é muito maior do que o meu pessimismo e acredito no surgimento, no século XXI, de uma Indústria de Cinema em Portugal (feita por portugueses, mas aberta às co-produções lusófonas e europeias) capaz de produzir obras suficientes, em qualidade e quantidade, para serem exportadas para o planeta inteiro, superando barreiras linguísticas com boas traduções e legendagens, e, especialmente, tratando assuntos que cativem os públicos mundiais pela sua originalidade e identidade.
Em frente, Cineastas do meu País!
Nota: Artigo escrito para a revista Alameda Digital. Republicado em novas versões nos blogues Eternas Saudades do Futuro, Jovens do Restelo e Delito de Opinião e no jornal O Diabo.
EU JÁ SABIA MAS CONFIRMEI NA BLOGOSFERA
Em Portugal, neste momento, há meia-dúzia de pessoas cultas, outras tantas com sentido estético, e igual número com ideias próprias. Contam-se pelos dedos de uma só mão as que conjugam os três factores.
domingo, 13 de janeiro de 2013
LITERÁRIO LABIRINTO
Os meus livros estão dispersos por quatro sítios diferentes: uma casa, dois apartamentos e uma cave. Isto não acontece por ser rico, mas, muito pelo contrário, por não possuir um lugar suficientemente grande para os reunir. O meu sonho é um dia tê-los todos junto de mim à mão de semear numa labiríntica biblioteca forrada a estantes de cima a baixo. Assim, cercado e perdido, seria feliz.
sábado, 12 de janeiro de 2013
sexta-feira, 11 de janeiro de 2013
CARTEIRA DE SENHORA
DIA 50
O título desta crónica
– penso já aqui ter contado – nasceu da mente brilhante do meu irmão mais novo.
A carteira emocionou-se na altura mas anda agora apreensiva. Teme pela sua
integridade física e as teorias de conspiração tiram-lhe o sono. Pelos exemplos
que a rodeiam, convenceu-se de que estava a decorrer uma campanha para a
destronar e substituir por outra palavra que irá sempre considerar menos digna.
Não hesitou, pois, esta semana.
O árduo trabalho de
dezenas e dezenas de anos a ensinar Portugal a tentar pronunciar a palavra
meteorologia sem tropeços acabou de ir pelo cano abaixo. A designação que, de
uma forma ou de outra, vinha a ser utilizada desde os anos 40 do séc. XX, foi
alterada em virtude da fusão de vários Institutos. E, mesmo existindo um
departamento que mantém o termo, é o novo nome do Instituto que se vem
aplicando aos que tão simpaticamente nos avisam das frentes frias ou do
anticiclone dos Açores, o eterno culpado da chuva nas Ilhas Britânicas.
Quando há uma fusão,
percebe-se a necessidade de um novo nome que reflicta a mesma. Ou quando um
nome ficou “queimado”, há que branquear e fingir que agora é algo completamente
diferente.
Mas esta teimosia em
mudar os nomes à viva força, em muitos casos não se entende. Até pelos gastos
em que se incorre por causa das alterações. Ele é logótipos, letreiros na
porta, software, carimbos, um sem
número de pequenas coisas de que ninguém se lembra antes, mas que se pagam.
Ora, sobretudo nos
casos em que existe história e tradição, a manutenção do nome só traz
prestígio. Os homens do marketing ainda
não perceberam. Há coisas em que não se deve mexer nunca. É deixá-las
sossegadinhas. Não vale a pena insistir, é tempo perdido.
Alguém duvida que na
boca do povo as Repartições de Finanças continuam a ser isso mesmo e não
Serviços, como agora se denominam?
A mesma situação
sucede com os Presidentes de Câmara, embora julgue que, neste caso, é de
propósito. Nada melhor para apagar alguém da memória colectiva do que dar o seu
nome à Rua Direita.
Os exemplos abundam
aqui em Lisboa e por certo noutros lugares, havendo mesmo mudanças de há
centenas de anos que nunca pegaram: Terreiro do Paço – Praça do Comércio, Campo
de Santana – Campo dos Mártires da Pátria e mais recentemente Praça do Areeiro
– Praça Sá Carneiro.
Nestes anos em que vamos
perdendo tudo, da soberania à comemoração da Restauração, temos de ter cuidado
(não é inédito!) não vá alguém lembrar-se de, numa gigantesca operação de marketing, alterar o nome da nossa Pátria…
Já é só quase o que falta.
Leonor Martins de Carvalho
quinta-feira, 10 de janeiro de 2013
O MESTRE
Faz hoje 88 anos que morreu António Sardinha. Um dos autores que mais me influenciou. Mal o descobri, aos 14 anos, logo senti com ele uma enorme afinidade, através da sua poesia, quase toda ela consagrada ao nosso comum Alentejo; e, por outro lado, fiquei fortemente fascinado pela sua doutrina — inteligentíssima renovação do pensamento político português. Enfim: poesia, história nacional, filosofia política, crítica das ideias e estudos variados; num só homem, pensando pela sua própria cabeça, é obra! Deus não o tivesse levado tão cedo e Portugal seria hoje certamente um lugar diferente.
PORTUGAL
Um líder, além de saber liderar, tem de saber lidar com as pessoas. Desde que ficámos reduzidos ao rectângulo, não apareceu nem um. Haja esperança.
LISBOA
Este blogue tem Lisboa como tema? Sim. Contudo, ao leitor, torna-se necessário pesquisar, além de saber ler nas entrelinhas; aliás, como em relação a muitos outros assuntos aqui tratados.
terça-feira, 8 de janeiro de 2013
RELATÓRIO & CONTAS
— 5687 mensagens publicadas.
— 124 seguidores.
— 202303 visitas.
— 375988 páginas vistas.
— 13173 visualizações do perfil do autor.
Dizem que para um blogue livre e independente, que não faz salamaleques ao regime nem ao sistema, não está nada mal.
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Dizem que para um blogue livre e independente, que não faz salamaleques ao regime nem ao sistema, não está nada mal.
ADENDA À MENSAGEM ANTERIOR OU NOVIDADE BLOGOSFÉRICA DO ANO
Como há sempre honrosas excepções para confirmar as regras, acabei de saber que se prepara uma grande novidade na blogosfera nacional. Assim sendo, os bloguistas politicamente correctos, que dão prémios uns aos outros, como manda o sistema, e que fingem que os blogues nacionais não existem, embora os leiam diariamente, vão ter mais um para lhes dar dores de cabeça. Graças a Deus!
JÁ NÃO HÁ NAVEGANTES COMO DANTES
Tinha eu esperança na minha proverbial ingenuidade que este ano fosse o do regresso numa nova arrancada de uma mão cheia de veteranos bloguistas que andam desaparecidos. Não só estes não dão sinal de vida como outros parecem querer igualmente sair de cena. Para completar a total desgraça constata-se que ninguém de valor e com valores faz tenção de iniciar-se nesta aventura.
segunda-feira, 7 de janeiro de 2013
PARA A EDUCAÇÃO ATRAVÉS DA SÉTIMA ARTE
Não gosto de todos os filmes. Gosto de filmes que são Sétima Arte. Com estes é que se fazem os sonhos e a História do Cinema. O sítio onde passam é a Cinemateca Portuguesa. Aqui se organizam, em criteriosos ciclos, as únicas sessões que frequento com gosto. Quanto às salas comerciais, cada vez mais: nem vê-las!
domingo, 6 de janeiro de 2013
AMANHÃS DE RESTAURAÇÃO
Ontem ouvi chilrear pássaros, vi rebentar flores, senti calor morno no ar. O nítido e aveludado céu azul estendeu-se no infinito sobre campos verdes a perder de vista. E terminei o dia ao pôr-do-Sol em amena tertúlia cultural à roda duma fogueira. Portugal é assim e nada existe de igual no mundo. Possa este clima gerar de novo amanhãs de restauração.
DIA DA EPIFANIA DO SENHOR E DOS REIS MAGOS
Para celebrarmos enquanto os republicanos, laicos e socialistas nos deixarem, pois eles detestam Reis, fogem como o diabo da Cruz e não podem ver o Menino Jesus nem pintado.
sábado, 5 de janeiro de 2013
DEMOCRACIA À GRANDE E À AMERICANA
Desta vez, os americanos decidiram levar a sua dama de nome Democracia às arábias, para ser louvada e até adorada. Português de velha cêpa que sou, quando ouvi falar na Primavera, pensei logo no Verão quente. Ele aí está. Só na desgraçada Síria os mortos contam-se já às dezenas de milhares. Os yankees abriram novamente a caixa-de-Pandora. E já se sabe que não costumam ter vontade nem capacidade para voltar a fechá-la. Normalmente, o seu conteúdo espeta-se-lhes na tromba, qual boomerang. Antes assim, para ver se aprendem a estar quietos, pois nós aqui na Europa não gostamos de ter arruaças à porta de casa.
sexta-feira, 4 de janeiro de 2013
CARTEIRA DE SENHORA
DIA 49
Imperdoavelmente a
carteira esqueceu-se de referir que a última crónica teve a contribuição
inesperada, generosa e preciosa de mais três pares de mãos. Estando a ficar
cansada de escrever através deste inábil par, agradeceu a novidade e até pediu para
repetir a festa. Não lhe vou tirar a esperança.
E sendo a primeira
crónica de 2013, é mesmo obrigatório falar de esperança. Precisamos dela como
nunca.
Esperança em Deus,
que nos abençoe para podermos enfrentar os violentos caminhos que nos trilharam.
Esperança em nós
próprios, na nossa capacidade de sobreviver como protagonistas nesta espécie de
filme de antecipação futurista em cenário dantesco.
Esperança nos outros
– na família, nos amigos e na comunidade – no seu amor que nos fortalece e na
bondade da sua partilha.
Esperança nos
portugueses, sempre capazes de tanto, e após anos manietados e até esquecidos
da sua própria voz, distorcida entretanto por senhores supostamente escolhidos
mas que nem conhecem, em conseguirem arranjar novas formas de se organizar,
provocando e participando em mudanças.
Esperança na
construção de um futuro diferente para Portugal e para o mundo.
Na classe política
não deposito muita esperança, para não dizer nenhuma (serei só eu?), mas
podemos sempre confiar que finalmente se lembrem de, num dia longínquo, terem
aprendido o significado dos vocábulos (tão simples!) honra, palavra,
consciência e valores e as ponham em prática.
Diz o povo que a
esperança é a última a morrer. Que povo sábio, o nosso…
Não nos podemos dar
ao luxo de perder a esperança, porque a desesperança, embora possa dar muito
jeito a alguns, condena um povo à prisão perpétua e pode até matar.
Tenhamos esperança
então, mas não esperemos. Há que fazer acontecer. Se acreditarmos em nós tenho
a certeza de que a esperança afinal é realidade. Já hoje.
Leonor Martins de Carvalho
quarta-feira, 2 de janeiro de 2013
CERTEZAS DE ANO NOVO (4)
Vejo cada vez pior ao perto e melhor ao longe. Antes assim, que o tempo presente é nevoeiro.